Estive pensando sobre como poderia me expressar em relação ao ato de lacrar alguma edificação ou local. Pensei na palavra “lacração”, mas me soou meio esquisito porque tem muita gente usando este termo com outra conotação. As palavras “lacragem” ou “lacramento”, me soaram incorretas. Então fui em busca do dicionário.
Lacração é um termo popular que pode ter vários significados como: encerrar uma discussão polêmica com uma frase de efeito, sem dar oportunidade ao adversário de responder; fazer algo muito bem, ou dizer uma coisa incrível; uma crítica feita com base em pressupostos moralizadores; uma forma de destaque positivo, grande sucesso ou arraso.
Lacragem, essa palavra não foi encontrada em nenhum dicionário, porém, por analogia com contagem, o ato de contar, a palavra pode ser associada ao verbo lacrar, sendo teoricamente associada ao ato de lacrar. Como nem todas as palavras em português estão dicionarizadas…
Lacramento é a forma muito pouco usada para a ação de fechar com lacre para impedir a abertura, a forma mais comum para esta ação é a lacração.
Em conversa com um amigo, discutimos o futuro próximo de alguns patrimônios edificados remanescentes em nossa cidade. Mencionamos alguns deles, bem conhecidos pelos moradores locais, veranistas e turistas.
Fomos então, aos poucos, citando aqueles que lembrávamos por sua importância no contexto histórico e cultural.
A casa N° 1, em vias de tombamento, como está hoje? Antigos moradores abandonaram a casa e a prefeitura, por ordem judicial, ficou responsável pela sua integridade. Solução usada pela prefeitura: lacrar. Portas, janelas, frestas, tudo lacrado.
Antiga escola Marcílio Dias ou, para muitos, escola Cenecista: lacrada. Paredes de tijolo e cimento selaram suas portas e janelas, e mato, sujeira e outros detritos ocupam seus corredores externos.
Antiga Prefeitura Municipal transformada em Museu: lacrada. Durante 8 anos de mandato do antigo prefeito a antiga prefeitura foi se deteriorando por infiltrações no teto que vinham de buracos no telhado. Buracos que nem sequer foram tapados com lonas que no mínimo evitariam um dano maior. Mais uma vez a solução foi: lacrar.
A primeira sede da SAPT, também conhecida como Bar Abrigo: lacrada. Ano após ano, emprestada, alugada ou cedida, hoje tem suas paredes emplastadas por camadas de tinta, fruto de anos de “reformas” em que o material mais usado foi ela a tinta branca.
O Torreão Salva Vidas, esquecido há anos por diversas administrações municipais, foi lembrado pela administração anterior, mas por motivos desconhecidos por muitos abortou a “reforma”. Solução: lacrar.
Concluímos que as soluções encaminhadas pelos nossos gestores ao longo dos anos em proteção ao nosso patrimônio edificado é uma só: lacrar. Fechar o local para protegê-lo, como se isso fosse realmente acontecer. Temos o exemplo mais longo dessa proteção, a Antiga escola Marcílio Dias/Cenecista lacrada há anos e quase condenada em face a sua destruição.
Antigamente isso era bem comum em todas as cidades do país, quando existia alguma edificação com algum valor histórico/cultural e as leis da cidade não a protegiam, as prefeituras simplesmente a esqueciam com a conivência dos proprietários até que um belo dia a casa não mais existia, tombando literalmente e não legalmente.
Ao final da conversa, ponderei com meu amigo que, diante da transformação do COMPAHC (conselho que poderia/deveria proteger esses bens históricos) de órgão deliberativo para consultivo, a proteção desses patrimônios depende, infelizmente, apenas da boa vontade de seus proprietários.
E quanto ao patrimônio histórico/cultural que pertence ao município, esse é ainda mais complicado, pois o próprio gestor e a municipalidade, representada pelos conselheiros do COMPAHC, os protegem lacrando e virando as costas para os seus legados.
Lacração, esta é a solução encontrada pelos nossos gestores.
Com informações de: Ciberdúvidas da Língua Portuguesa.
