Semana passada o assunto central da Mídia foi a saúde do Lula. Não faltaram aí, inclusive, manifestações indecorosas de alguns, regozijando-se com sua morte eventual. Lamentável. Nesta semana a questão do dólar está ocupando as manchetes. Saltou de R$ 5,7 para um nível de R$ 6,30 no dia 19/12. Tocou horror. Os alarmistas de sempre saem a campo dizendo que a inflação vai explodir, enquanto os governistas denunciam um ataque especulativo. Em meio às controvérsias Haddad, Ministro da Fazenda, reitera que não há perigo nenhum: os indicadores da economia demonstram que estamos indo bem. Um atento e experiente analista econômico, Eduardo Moreira, porém se detém na análise dos fatos e sugere a metáfora do sequestro para explicar os riscos da conjuntura. Diz ele: o sequestrador não pratica o seu crime para matar a vítima, mas para ganhar uma grana, sabendo, entretanto, que pode dar tudo errado e vir a ser morto pela Polícia.
A situação que estamos vivendo é a seguinte: Vivemos uma etapa da economia (de mercado) capitalista totalmente dominada pelos interesses financeiros. No Brasil isso é ainda mais acentuado pela forte concentração bancária de nossos sistemas. Eles constituem, na verdade, o que tradicionalmente se denomina como classe dominante, mas eles preferem denominar-se “Mercado”. Já não são os proprietários de terras, nem os donos das grandes empresas industriais. São donos de tudo isso e mais alguma coisa: a capacidade de movimentar o capital dinheiro aquém e além fronteiras sem maiores limites. Foi-se o tempo da “mais-valia”, medida pelo excesso de horas de trabalho que os operários entregavam aos empresários industriais sobre o seu custo de reprodução. Isso subsiste, sobretudo em empresas “fechadas”, mas tradicionais, de grande impacto no emprego formal mas baixa representação na valorização do PIB. Isso não é de fácil compreensão para a maior parte das pessoas que vivem mais de “impressões” sobre o que significa o processo dominação numa sociedade de classes, como a nossa.
O homem simples das ruas, republicano e universal, como o dizia Cassiano Ricardo num famoso poema, vê o mundo com os olhos e ouvidos singelos sem se dar conta das camadas geológicas que formam a sociedade e controlam a opinião pública. Para ele, rico é o cara da casa mais bonita da rua de cima que tem um carro zero. Nas cidades maiores chega a ter uma ideia de que há um seleto grupo de privilegiados donos de imóveis, estabelecimentos, membros do Rotary e suspeitos de serem maçons. Dificilmente percebe que sobre a economia nacional impera um conjunto de grandes interesses financeiros que não são apenas donos do dinheiro, mas donos, através de seus investimentos, de grande parte dos ativos mobiliários – Bolsas, Dólares, Aplicações, S/As etc. – , como, também imobiliários. Além de donos da “bola”, estes setores são, senão diretamente proprietários das grandes Redes de Comunicação, seus principais anunciantes e, com isso, controlam o que os diligentes leitores leem, veem e escutam nas rádios o dia inteiro.
Quantos são eles? No mundo inteiro calcula-se que seja apenas 1% da população global; no Brasil, segundo o ATLAS SOCIO ECONOMICO do IPEA, bem menor: 0,01%, ou cerca de 200 mil abençoados bilionários. Não são pessoas más, muitos até são piedosos crentes de suas confissões e frequentam regularmente seus templos e livros sagrados. Mas têm interesses e os defendem com unhas e dentes. Em contrapartida a este bloco de interesses se situa o interesse na Nação, com cerca de 100 mil trabalhadores ativos e 25 milhões de inativos, maioria dos quais vivem com até 1 Salário Mínimo por mês, uma classe média em torno de 50 milhões que cresce de cima para baixo muito lentamente, e uma infinidade de brasileiros que sequer aparecem nas estatísticas procurando emprego ou recebendo alguma coisa. Os interesses destes nem sempre coincide com o interesse dos que compõem a cúpula da sociedade. De entremeio a eles, está o Governo, supostamente representativo seja da cidadania em geral, seja do Estado como entidade encarregada de preservar não só o território nacional, mas um mínimo de segurança nas suas várias acepções: Segurança Nacional, Segurança Pública e Segurança Civil, onde habita desde o Meio Ambiente, as pessoas e as instituições. Não é muito fácil digerir isso tudo e , ao mesmo tempo, ver em que medida isso se articula com o sistema político que elege de tempos em tempo um Presidente da República pelo voto direto e uma Câmara dos Deputados pelo proporcional.
Ultimamente, vive-se o dilema da inflação, do dólar e do déficit público. O dito Mercado, que em nada se confunde com o mercadinho da esquina, quer AUSTERIDADE DO GOVERNO e corte de gastos porque tema que o déficit se torne impagável e engula seus R$ 3 trilhões investidos em ORTN. Temem que ao aumentar o déficit a inflação mais alta também corroa o valor de sua “Poupança”. Até já procuram a garantia de dólares para evitar o pior, mas, com isso, aumenta a taxa de câmbio, que num círculo vicioso acabara elevando ainda mais os preços. É O dilema do sequestrador. Tendo pressionado o Governo reticente aos seus apelos, agora aguarda o desfecho do “crime”: Uma negociação amigável. Estão todos de orelha grudada no telefone na Faria Lima, aguardando os acontecimentos. Não irão esticar ainda mais a corda.