DIÁRIO DE MOCHILA – Litoral Baiano entre meditação, caronas e hippies

Buenas! Na última postagem falei dos 30 dias em que morei no veleiro Wayan, o qual me despedi quando cheguei ao litoral da Bahia. Muitas mudanças em mim estavam por vir, conforme relato abaixo. Boa leitura a todos!

FOTO - Pipe na Praia do Espelho, Bahia
16 de julho de 2022

Ago/Set/Out-2020 – voltando à terra firme

 

Entrei no Veleiro Wayan uma pessoa e saí outra. Perdi muita frescura. Aprendi a viver com o básico do básico e não ter praticamente nada de conforto. Aprendi a ter paciência, pois ela sempre era muito necessária. Foram 30 dias que mais pareceram 1 ano, por toda intensidade das vivências e aprendizados. A sensação que tenho é que essa experiência foi uma preparação para o litoral da Bahia e todas as transformações que ele me traria a seguir. Sinceramente, os 3 meses em que perambulei pela costa baiana não tiveram grandes histórias. Foi o estado em que pela primeira vez senti estar mochilando de verdade. As cidades estavam reabrindo após o primeiro lock down (em decorrência da pandemia), e a vida parecia estar um pouco mais próxima do que era antes. Fiz muitas amizades por lá e conheci cenários paradisíacos. Mas o fator principal desse período foi que ele me causou mudanças importantíssimas, as quais carrego comigo até hoje.

 

Meditando

 

Meu colega de tripulação no barco, Dani, meditava de vez em quando. Sem nunca ter meditado em minha vida, nem entender nada a respeito, um dia perguntei a ele como que funcionava. Ele me disse: “Feche os olhos e concentre apenas na respiração. Se pensamentos vierem a cabeça, volte a concentrar na respiração”. E foi esse o ensinamento que tive e que passou a ser um exercício diário para mim logo que cheguei na Bahia. No início, como tudo na vida, era mais difícil. Eu aguentava poucos minutos e logo tinha que abrir os olhos, ficava agoniado. Mas com o tempo e a prática a duração de cada meditação foi aumentando e com ela, os resultados. Comecei a entender como isso acalmava e trazia a mente e o corpo para o presente, fazendo tudo fazer mais sentido. Me fazia ter consciência. Em outro momento pretendo explanar mais sobre esse assunto, mas por hora é importante deixar claro que meditar passou a ser uma rotina diária em minha vida, até os dias de hoje, e fez eu mudar completamente minha concepção de mundo e de mim mesmo.

 

Levanta o dedo e sorri

 

FOTO – Uma das primeiras Caronas numa Caçamba

 

O episódio em que peguei minha primeira carona, quando estava no litoral norte de São Paulo, ficou na minha cabeça. Por que não seguir minha viagem de carona? Além de baratear e muito minha jornada, eu sentia que isso me traria grandes aprendizados. Mas nesses momentos temos medo de sair da zona de conforto e ir para o desconhecido, o que dificulta o passo inicial. Depois de umas semanas matutando isso em minha cabeça, decidi fazer o teste. Se não desse certo ou não gostasse, voltaria para o jeito convencional com ônibus, vans e caronas pagas.

Meu primeiro teste foi na cidade de Itacaré, onde algumas praias mais isoladas só poderiam se chegar com carro particular, ou táxi. Decidi ir na carona e deu certo. Fui caminhando até a saída da cidade e, embaixo de uma árvore, parei e comecei a levantar o dedo para os carros que passavam. Eu acredito que simpatia sempre ajuda, então meu sorriso sempre estava bem aberto. E em poucos minutos um carro parou. Foi mais simples do que eu esperava e muito divertido! Na volta, a mesma coisa. A partir daí decidi que minha viagem ia seguir apenas na carona “a dedo”, forma principal que me locomovo até hoje. Meu medo inicial havia sido quebrado e eu vi que não tinha nenhum mistério. Friso que tenho consciência de que ser branco e loirinho facilitam a dinâmica, e muito.

Tive uma carona muito marcante indo em direção a Salvador, quando meu carona Cícero (hoje meu amigo), alem de dar carona, me pagou uma moqueca na beira da praia e ainda me deu R$50,00. Na época eu não queria aceitar o dinheiro, mas ele insistiu. Resolvi devolver para o universo, quando comprei comida para uma família carente ao chegar na capital baiana.

 

Esse tema “Carona” também merece um destaque maior por ter sido responsável por tantas mudanças em mim e no meu estilo de vida. Em outro momento, também pretendo entrar mais a fundo nessa explanação.

 

Meu lado ‘hippie’

FOTO – Pipe numa comunidade hippie em Arembepe (Bahia)

 

A nova dinâmica das caronas foram me mudando muito rápido e trazendo cada vez mais a tona uma parte de minha essência que sempre tive, a da simplicidade. Fui cada vez mais dando menos importância para o “ter” e mais importância para o “ser”. Na maioria dos casos, quem me dava carona eram pessoas muito simples, as quais eu conversava e aprendia muito. Mas o litoral da Bahia é uma das regiões mais turísticas do Brasil. E foi lá que comecei a entender a diferença de um lugar turístico para um lugar não turístico. Na Bahia, normalmente já é difícil achar o preço de algo exposto. Ele é dado pelo vendedor na hora que se pergunta. E eu comecei a me dar conta que os meus preços estavam mais altos que o normal. Me dei conta também que, sempre que eu ia perguntar um preço, a pessoa olhava primeiro para minha corrente de ouro (que ganhei ainda criança  da minha família e sempre usei comigo) e depois dava o preço. Fora que, muitas vezes, aos invés de um “bom dia”, eu recebia um “Buenos dias”, ou “Good morning”. Foi então que decidi tirar e guardar minha corrente. Comecei a usar apenas minhas roupas mais velhas e rasgadas e, por fim, andava apenas descalço. Até mesmo nas ruas da capital Salvador. Consequentemente, comecei a ter bicho de pé, que no início incomodava (mas depois se tornou até um passatempo tirá-los de mim).

Fiquei alguns dias numa aldeia Hippie em Arembepe, onde os hippies me deram um colar com um dente de capivara pendurado. Além disso, me ensinaram muito sobre o estilo de vida deles, o qual passei a ter total admiração e tirei muitas lições. Em resumo, o litoral da Bahia me deu alguns novos traços de hippie. Esse foi um movimento natural e instintivo, visando não me parecer muito um turista gringo pelo motivo financeiro, de não pagar valores acima do normal, mas principalmente para ter um contato mais próximo com o povo, que era com quem eu queria realmente estar. Isso fazia com que eles me olhassem mais como alguém próximo a eles. E esse interesse foi me fazendo deixar aos poucos de frequentar lugares turísticos (comercialmente dizendo). Digamos que a Bahia me fez entender também que eu não estava de férias. Minha vida agora era a estrada e meus interesses eram outros. E comecei a entender mais isso quando mudei meus planos e resolvi adentrar no interior do país. Aos poucos fui sentindo que todas aquelas praias lindas não me deslumbravam mais como antes. Precisava de um fato novo. Foi quando me despedi do oceano, após 10 meses ininterruptos em sua frente, e me direcionei para a Chapada Diamantina, no interior da Bahia. Assunto da semana que vem, até lá!


Publicado em: Turismo






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