Brasil: os carros mais caros do mundo

3 de janeiro de 2012

Por Guilherme Rocha*

   

Quando pensamos sobre os altí­ssimos preços dos carros no Brasil, o principal culpado que vem em mente são os tributos. Todo mundo sabe que a carga tributária brasileira é muito elevada. Serão arrecadados em 2011, de acordo com o site Impostí´metro, um total de 1,5 trilhíµes de reais, provenientes de impostos municipais, estaduais e federais pelo paí­s. Isto, sem dúvida alguma, compromete o preço dos automóveis, que tem de pagar 30% em tributos. Entretanto existem alguns indí­cios sugerindo que a culpa por esse valor ser tão alto está, também, por trás do lucro das montadoras no Brasil. Em nenhum lugar do mundo (que possua uma economia forte e um PIB relevante) as montadoras lucram tanto quanto em nosso paí­s.

Chevrolet Camaro SS: custa R$ 185 mil no Brasil, mas chilenos pagam o

equivalente a  R$ 89 mil, e americanos, R$ 54 mi.

     

Comparaçíµes**

   

Algumas comparaçíµes para ilustrar o quanto o brasileiro sofre mais que em outros paí­ses na hora de comprar um carro:

   

·                 Volkswagen Jetta: Importado do México, sedã é vendido no Brasil com preço inicial de R$ 65.700; na origem, carro custa o equivalente a R$ 32.500

 

·                 Honda Civic LXS: No Brasil, sedã básico é vendido por R$ 66.660; na Argentina, R$ 42.680; nos EUA, nova geração do carro começa em R$ 24.900

 

·                 Novo Ford Fiesta: Importado do México, sedã começa em R$ 50.700 por aqui; mexicanos pagam R$ 28 mil e argentinos, R$ 32.460

 

·                 Volkswagen Gol I-Motion: Fabricado no Brasil, hatch automatizado custa R$ 46 mil por aqui; no Chile, sai por apenas R$ 29 mil

 

·                 Toyota Corolla: custo do sedã mais básico começa em R$ 59.400 no Brasil; na Argentina, cai para R$ 34.176; nos EUA, é de apenas R$ 24.380

   

Por quê? Os principais argumentos das montadoras para justificar o alto preço do automóvel vendido no Brasil são a alta carga tributária e a baixa escala de produção. Outro vilão seria o alto valor da mão de obra, mas os fabricantes não revelam quanto os salários “ e os benefí­cios sociais “ representam no preço final do carro. Muito menos os custos de produção, um segredo protegido por lei.

 

A indústria automobilí­stica culpa também o que chama de Terceira Folha pelo aumento do custo de produção, isto é: gastos com funcionários, que deveriam ser papel do estado, mas que as empresas acabam tendo que assumir, como condução, assistência médica e outros benefí­cios trabalhistas.

   

Alta carga tributária?!

   

De 1997 até agora, o carro popular teve um acréscimo de apenas 0,9 ponto percentual na carga tributária, enquanto nas demais categorias de carros o imposto não cresceu, diminuiu: o carro médio a gasolina, por exemplo, paga 4,4 pontos percentuais a menos do que em 1997. O imposto da versão álcool/flex caiu de 32,5% para 29,2%. No segmento de luxo, a taxação também é menor em 0,5 ponto no carro e gasolina (de 36.9% para 36,4%) e 1 ponto percentual no álcool/flex.

 

Enquanto isso, a carga tributária total do Paí­s, conforme o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, cresceu de 30,03% no ano 2000 para 35,04% em 2010. Quer dizer,  o imposto sobre veí­culos não acompanhou esse aumento. Não é um motivo para argumentar que o imposto brasileiro sobre carros continua astroní´mico. Assim como no   futebol, é difí­cil bater o Brasil quando o quesito é imposto.

 

Isso sem contar as açíµes do governo, que baixaram o IPI (no caso dos carros 1.0, o IPI foi  totalmente retirado) durante a crise econí´mica. A polí­tica de incentivos durou de dezembro de 2008 a abril de 2010, reduzindo o preço do carro em mais de 5% sem que esse benefí­cio fosse realmente repassado para o consumidor.

     

Mesmo sem imposto, carros continuariam caros

   

Mas mesmo se descontássemos as pilhas de impostos que incidem sobre o preço dos veí­culos no Brasil, correspondente a 30,4% do valor (nos EUA a mordida é de 6,1%), nosso carros ainda seriam mais caros.í‰ o que indica uma matéria do jornal Estado de São Paulo os dados das empresas automobilí­sticas e da Anfavea, a associação dos fabricantes de veí­culos instalados no Paí­s.

 

O Chevrolet Malibu, por exemplo, custa a partir de R$ 89.900 no Brasil. Tirando IPI, ICMS e PIS/Cofins, o valor poderia cair para R$ 57.176. Mesmo assim, estaria mais caro do que nos Estados Unidos, onde carro sai por R$ 42.300, já com os impostos, para o consumidor de Nova York.

 

O Ford Focus Sedan está em situação semelhante. Sem impostos, o preço poderia cair de R$ 56.830 para R$ 39.554 no Brasil. Porém, em nova York esse veí­culo custa R$ 30.743 (já com a tributação).

 

 

Novo Ford  Fiesta: Importado do México, sedã básico começa R$ 50.700 por aqui; mexicanos

pagam R$ 28 mil e argentinos, R$ 32.460

   

Baixa escala de produção?!

   

Com um mercado interno de um milhão de unidades em 1978, as fábricas argumentavam que seria impossí­vel produzir um carro barato. Era preciso aumentar a escala de produção para, assim, baratear os custos dos fornecedores e chegar a um preço final no ní­vel dos demais paí­ses produtores.

 

Pois bem: o Brasil fechou 2010 como o quinto maior produtor de veí­culos do mundo e como o quarto maior mercado consumidor, com 3,5 milhíµes de unidades vendidas no mercado interno e uma produção de 3,638 milhíµes de unidades.

 

Pergunta pertinente: Três milhíµes e meio de carros não seria um volume suficiente para baratear o produto? Quanto será preciso produzir para que o consumidor brasileiro possa comprar um carro com preço equivalente ao dos demais paí­ses?

 

Segundo Cledorvino Belini, presidente da Anfavea, é verdade que a produção aumentou, mas agora ela está distribuí­da em mais de 20 empresas, de modo que a escala continua baixa. Ele elegeu um novo patamar para que o volume possa propiciar uma redução do preço final: cinco milhíµes de carros.  

     

Montadoras e as grandes margem de lucro

   

As montadoras têm uma margem de lucro muito maior no Brasil do que em outros paí­ses. Uma pesquisa feita pelo banco de investimento Morgan Stanley, da Inglaterra, mostrou que algumas montadoras instaladas no Brasil são responsáveis por boa parte do lucro mundial das suas matrizes, e que grande parte desse lucro vem da venda dos carros com aparência Off Road.

 

Derivados de carros de passeio comuns, esses carros ganham uma maquiagem e um estilo aventureiro. Alguns têm suspensão elevada, pneus de uso misto, estribos laterais. Outros têm faróis de milha e, alguns, o estepe na traseira, o que confere uma aparência mais esportiva.

 

Estes carros são altamente lucrativos para as montadoras: a Morgan Stanley estima que o custo de produção desses carros, como o CrossFox, da Volks, e o Palio Adventure, da Fiat, fica entre 5 a 7% acima do custo de produção dos modelos dos quais derivam: Fox e Palio Weekend. Mas são vendidos entre 10% a 15% mais caros.

 

O analista Adam Jonas, responsável pela pesquisa, concluiu que, no geral, a margem de lucro das montadoras no Brasil chega a ser três vezes maior que a de outros paí­ses.

     

              O exemplo do Honda City

   

O Honda City é um bom exemplo do que ocorre com o preço do carro no Brasil, e do lucro acumulado pelas montadores. Ele foi analisado em matéria feita pelo jornalista Joel Leite, do site Auto Informe. Fabricado em Sumaré, no interior de São Paulo, ele é vendido no México por R$ 25,8 mil (versão LX, versão básica).

 

Neste já preço está incluí­do o frete até o paí­s, correspondendo a R$ 3,5 mil, e a margem de lucro da revenda, em torno de R$ 2 mil. Restam, portanto R$ 20,3 mil.

 

No Brasil, indica Joel Leite, adicionam-se os custos de impostos e distribuição aos R$ 20,3 mil, que equivalem a R$ 16.413,32 de carga tributária (de 29,2%) e R$ 3.979,66 de margem de lucro das concessionárias (neste caso de 10%). A soma resulta em R$ 40.692,00.

 

Considerando que nos R$ 20,3 mil contabilizados com a venda do carro ao  México a montadora já teve sua margem de lucro, o Lucro Brasil (ou adicional) abocanhado pela montadora é de R$ 15.518,00 correspondente aos R$ 56.210,00 (preço que o carro é vendido no Brasil) menos R$ 40.692,00.

 

Isso sem considerar que o carro básico que vai para o México tem muito mais equipamentos de série que o básico brasileiro: freios a disco nas quatro rodas com ABS e EBD, airbag duplo, ar-condicionado, vidros, travas e retrovisores elétricos. O motor é uma das poucas semelhanças que equipa a versão vendida no Brasil.

 

Volkswagen Gol I-Motion: Fabricado no Brasil, hatch automatizado

custa R$ 46 mil por aqui; no Chile, sai por apenas R$ 29 mil

   

O que vale é o preço que o mercado paga

   

Mesmo lembrando que Brasil e México possuem um acordo comercial que isenta a cobrança de impostos de importação, fica a pergunta: Como é possí­vel um carro fabricado no Brasil ser vendido, com lucro, por menos da metade do preço em outro paí­s? Na Argentina, nossos vizinhos, a situação se repete. A versão básica do Honda City (LX), com câmbio manual, airbag duplo e rodas de liga leve de 15 polegadas, custa a partir de US$ 20.100 (R$ 35.600).

 

 E será possí­vel que a montadora tenha um lucro adicional de R$ 15,5 mil num carro que é brasileiro, e ninguém fale nada? Ouvido pelo site AutoInforme (do UOL), o presidente mundial da Honda, Takanobu Ito, confessou que, retirando os impostos, o preço do carro no Brasil é mais caro que em outros paí­ses. Isso ocorreria porque no Brasil se pratica um preço mais próximo da realidade. Lá fora é mais sacrificado vender automóveis.

 

Ito disse que o fator  câmbio pesa na composição do preço do carro no Brasil, mas lembrou que o que conta é o valor percebido. O que vale é o preço que o mercado paga. Ou seja, ainda que o preço seja alto, há quem pague, e pague bem.

 

E porque será que o consumidor brasileiro paga mais do que os outros?  O presidente da Honda não sabe. Eu também queria entender ,   a verdade é que o Brasil tem um custo de vida muito alto. Até os sanduí­ches do McDonalds aqui são os mais caros do mundo.

     

              Concluindo…

   

Independente do preço final , 30% é uma tributação muito alta para um carro, isto é inegável. Ainda que nos últimos tempos o governo e os bancos tenham criado certos incentivos para teoricamente tornar mais fácil a compra de veí­culos, esses incentivos são tão pequenos comparados com a realidade brasileira que parecem uma piada. Fora o fato de, pelo carro ser astronomicamente caro, a pessoa que pensa em comprar um carro em nosso paí­s tem que pensar também nas dezenas de prestaçíµes com juros altí­ssimos a pagar, que fazem com que o valor final do carro torne-se quase o dobro do preço original. Ou seja: um americano compra um Honda Civic a vista por R$25 mil, enquanto no Brasil o mesmo carro (que por aqui custa R$ 66 mil) sairá por mais de R$ 100 mil depois de 36 parcelas com juros.

 

E por isso que outro grande culpado pelo alto preço dos automóveis (além dos altos impostos, juros e da ganância das montadoras) é o próprio povo brasilieiro. Há muito tempo que os preços não são definidos pelo custo do produto. í‰ mercado consumidor quem define o preço. Por que as montadoras baixariam os preços dos carros se continuamos pagando uma fortuna por eles? E ainda tem muita gente que quase sente tesão em pagar mais de R$ 100 mil por um carro: não só pelo conforto, estilo e segurança que esses carros trazem, mas sim para mostrar seu poder as demais pessoas.

 

í‰ claro que, para os que tem condiçíµes, é difí­cil deixar de comprar para baixar esses preços, pois muita gente precisa de um carro. Nosso sistema de transporte público é precário e andar de moto ou bicicleta torna-se cada dia mais perigoso. Mas é possí­vel passar um ou dois anos a mais com seu automóvel antes de trocá-lo. Ou até, quando for comprar outro veí­culo, opte por um semi-novo.  Além de ajudar seu bolso, ainda pressionará as montadoras a baixar os preços dos carros novos.

 

       *Com informaçíµes dos sites Auto Informe (UOL), Estadão, BBC Brasil e Wikipedia**Valores baseados em junho de 2011


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