MUNDO MUNDO, VASTO MUNDO: Colcha de retalhos

"...os Impérios repetem a ordem da vida: nascem, desenvolvem-se e voltam ao pó, sem que se compreenda com precisão as causas de sua decadência, sempre lenta." ( por Paulo Timm)

13 de outubro de 2020

O mundo escuta apreensivo os clamores vindos do centro da terra. Quando a Cidade Eterna locuta, o Império sacode, os povos tremem. Era assim já no tempo dos faraós, que desde então encantam os potentados. Quando Alexandre, o Grande ia para uma nova batalha, seus generais prendiam a respiração. Herdaram, na sua morte, um grande legado, dentre eles o Egito que acabaria seus dias de glória com uma grega ptolomaica.  Napoleão inspirava grandes compositores. Beethoven que o diga. Um resfriado da Rainha Vitória deixava os mares agitados. A única diferença é que, se antes os Impérios duravam milênios e depois séculos, hoje, a hegemonia se esgota em décadas. A União Soviética, por exemplo, não chegou a cem anos. No lado ocidental, estamos perto disso sob a túnica norte americana.  Mas os Impérios repetem a ordem da vida: nascem, desenvolvem-se e voltam ao pó, sem que se compreenda com precisão as causas de sua decadência, sempre lenta. Inúmeros livros tratam disso, dentre eles um que me impressionou: A Marcha da Insensatez, de Bárbara Tucman.  Hoje estamos distantes da glamourosa década de1990 quando a Pax Americana prometia o fim da História com a eliminação dos conflitos entre as nações sob o impacto das ideologias.

Em de setembro de 2001, quando internamente a América já sofria os efeitos da globalização, com grandes segmentos de sua indústria e emprego transplantados para a Ásia, produzindo milhões de desempregados e reduzindo drasticamente a transferência da produtividade para os salários, a História vestida de valores religiosos bate à sua porta.  Foram-se as Torres Gêmeas. Na mesma década, em 2007 e 2008 sobrevém o impacto da crise financeira, quebrando a espinha dorsal da sociedade afluente: a classe média. O resultado foi o registro de 40 milhões de pobres, muitos deles casais idosos, outrora clientes de luxuosos cruzeiros internacionais, internados em suas pequenas cidades à custas de vale alimentação. Os déficits fiscais se sucedem em escala cada vez maior enquanto a perda de concorrência internacional só consegue manter o equilíbrio cambial graças ao poder do dólar como reserva de valor, a custo zero para sua fábrica. Salgando a conjuntura, torna-se mais aguda internamente a crise étnica. Hoje, diversas cidades americanas se encontram conflagradas. As conquistas civis da década de 1960 e as políticas afirmativas que se seguiram foram capazes de produzir a elite negra à frente do “Black” Lives Matter, mas manteve na margem o grosso dos afro-americanos, aos que somam milhões de latinos e asiáticos. Os falcões do Departamento de Estado, contudo, não perdem a pose e continuam alimentando com retórica humanitária a ‘gendarmeria’ imperialista. “Historicamente inclinados para considerar a guerra como meio de resolver conflitos, os EUA têm vindo a gastar em aventuras militares a riqueza que podia ser investida no país. Desde 2001, os gastos militares ascendem a 6 trilhões de dólares. Recentemente, o ex-presidente Jimmy Carter lamentava que, em 242 anos de existência, os EUA só tivessem estado em paz durante 16 anos”. Soou o gongo, entregando os americanos à sanha de um Presidente alucinado quanto ignorante que se acha capaz de reconstruir a grandeza do passado com um muro de papel na fronteira com o México e diatribes contra a China. Vive fora da realidade, acreditando nas mentiras que diz.

Os conflitos europeus acabaram em 1945, a Guerra Fria contra a URSS foi ultrapassado e o mundo entrou numa Nova Era com protagonistas revigorados. A China, desde sempre entre as maiores economias internacionais, até que os Impérios Inglês e Japonês a golpeassem entre fins do século XIX e primeira metade do século XX, recobra seu papel como dominante no mercado mundial e senhora da tecnologia de ponta. Acaba de destinar US $ 1,3 trilhão para a produção de chips e semicondutores, apostando no deslocamento do eixo comercial do Atlântico para a Rota da Seda. Ameaça silenciosa e isoladamente, certa de seu papel hegemônico em futuro próximo.

Além da China, Rússia, com Putin, volta à cena internacional, mais pobre e menos vigorosa do que a extinta URSS, mas não menos pretensiosa como elo de ligação entre Leste e Oeste, usando para tanto países até então desconhecidos como o Cazaquistão, ou mesmo Irã e Síria.  Turquia, com Erdogan, relembra aos aliados sua condição milenar como sede do Grande Império Otomano. Nunca foi colônia de ninguém. A Índia, outra milenar cultura, prepara-se, também, para a geopolítica dos vários centros de poder mundial, fundados na tecnologia. A União Europeia a tudo assiste, perplexa e sem rumo.

Diante deste cenário, dois candidatos em idade avançada disputam a Presidência dos Estados Unidos, ambos distintos em atitudes mas frutos de um sistema partidário pasteurizado pelo domínio conjugado de grandes conglomerados financeiros e altas patentes militares sobre o Estado. Não há muito a dizer. Talvez não seja a hora nem de lamentar, nem de sorrir, talvez compreender.

 

 




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