O ‘índio endiabrado’ torrense, Severiano Rodrigues da Silva

"Severiano Rodrigues dá nome a uma praça esquecida pela população torrense: a praça em frente à igreja matriz São Domingos. Ele nasceu na Roça da Estância (hoje parte do município de Mampituba) e começou a participar da vida política torrense a partir da revolução de 1923, em que Chimangos e Maragatos brigavam pelo poder na província".

30 de setembro de 2022

O município de Torres já foi bem maior do que vemos hoje. Arroio do Sal, Três Cachoeiras, Três Forquilhas (Guananazes), Mampituba e Dom Pedro de Alcântara eram distritos que se transformaram em municípios e, desta forma, reduzindo o tamanho do município de Torres. Mas antes disso acontecer, todos que nasciam nestes distritos, até então, distantes da sede, eram sim torrenses de nascimento.

Um deles foi o Severiano Rodrigues, que dá nome a uma praça esquecida pela população torrense: a praça em frente à igreja matriz São Domingos. Ele nasceu na Roça da Estância (hoje parte do município de Mampituba) e começou a participar da vida política torrense a partir da revolução de 1923, em que Chimangos e Maragatos brigavam pelo poder na província. Esta disputa política entre Borgistas (Chimangos) e Assisistas (Maragatos) dividiu o Rio Grande do Sul, depois de haver uma fraude eleitoral na disputa pela presidência do estado. A oposição, liderada por Assis Brasil, aderiu à revolta armada para derrubar Borges de Medeiros, que tomou posse para um novo mandato, em 25 de janeiro de 1923.

E aqui por Torres no governo de João Pacheco de Freitas, o Cel.Pacheco, (muito amigo do presidente eleito da Província, Borges de Medeiros) foi criada uma guarnição para a proteção da cidade, visto que havia rumores de que os revoltosos chegassem aos municípios do nordeste gaúcho, com a intenção de tomarem as vilas de Santo Antônio da Patrulha, Conceição do Arroio e Torres.

Essa guarnição, chamada de Corpo Provisório, subordinado à Brigada Militar, era composto por 53 homens obedecendo a seguinte hierarquia: O Comandante era o Capitão Bibiano da Silveira Lopes, que exercia o cargo de subintendende do 3° Distrito; Tenente Jacinto de Oliveira; o Alferes Severiano Rodrigues da Silva; 1° Sargento Antônio Luiz de Freitas Sobrinho; 2° Sargento João Fernandes da Costa; 3° Sargentos Abel Inácio de Matos e Alziro Vidal Ramos; 5 cabos e 41 praças. Basicamente esta guarnição só fez exercícios de patrulhar as costas da serra, por onde ameaçavam invadir o município, e também patrulhavam os limites da cidade.

Em uma destas missões no interior, a bravura do então Alferes Severiano Rodrigues da Silva, foi extremamente necessária. Observando a descida de numerosos revolucionários pela serra da Pedra Branca, próximo à Roça da Estância, Severiano posicionou seu diminuto grupo de cinco praças em cima de um pequeno Monte e entrincheirados atrás de uma grossa taipa de pedras deram vários tiros em direção dos invasores. Estes, surpresos e aterrorizados com a inesperada recepção retrocederam imediatamente. A partir daí, Severiano, que já tinha uma ótima posição nesta guarnição e gozava do apoio do Cel. Pacheco, começou sua fama no município.

“…de espadagão à cinta, cavalgando um corcel Napoleônico, a figura, quase lendária, daquele bugre endiabrado.”

Assim descrito no Jornal O Torrense, Severiano já era delegado de polícia em 1925. Já bem mais tarde, em 1949, foi eleito prefeito municipal.

“O povo de Torres, no último pleito municipal, buscou, no recanto onde vivia modestamente, índio Severiano, e fez dele o cacique da comuna, num pleito renhidíssimo (sangrento) onde seus opositores perderam por 13 votos. Temiam, os que discordavam do seu nome, que um índio quase analfabeto deslustrasse a curul (cadeira reservada aos mais altos dignitários) municipal, de vez que, durante a ditadura, o cargo de prefeito fora exercido por brilhantes figuras da cultura riograndense. O índio, entretanto, parece endiabrado. De posse do cargo de cacique, desmentiu a indolência da raça. Estuda todos os problemas locais. Trabalha dia e noite. E, está realizando em sua taba uma das mais profícuas e brilhantes administrações do Estado.”

Nos dois primeiros anos de mandato, Severiano fez uma verdadeira metamorfose na cidade, de abandonada passou a ser uma das mais progressivas do estado. Calçou as ruas, renovou a usina termelétrica, embelezou e floriu as praças da cidade, abriu estradas pelo interior do município e se empenhou na melhoria das outras existentes.

Neste mandato, que foi o único, ainda construiu a Prefeitura (hoje Museu), viu surgir o grande prédio da SAPT, participou da vitória sobre as dunas que ameaçavam a cidade, foi responsável pela construção do prédio dos Correios, do hospital Nossa Senhora dos Navegantes, enfim, viu e participou da transformação da pequena vila em uma cidade em crescimento.

Severiano, o índio endiabrado, folclórico, mas acima de tudo um grande administrador. Um nome de praça é, realmente, muito pouco para essa grande figura torrense.

 

Fontes: Jornal “O Torrense” e livro Torres, história em crônicas.




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