OPINIÃO – VIVA A REPÚBLICA

"Na Constituição de 1824,  consagrou-se, como resquício do Absolutismo, o PODER MODERADOR do Imperador. Foi uma excrescência autoritária que acabou se ramificando em anos posteriores. Na Proclamação da República, este Poder foi extinto, mas acabou sendo assumido pelas Forças Armadas, sobretudo o Exército..."

Proclamação da República - pintura por Benedito Calixto, 1893
29 de março de 2025

Nesta semana, dois acontecimentos importantes e interligados, do ponto de vista da vida pública no Brasil: Aniversário, no dia 25 de março, da primeira Constituição, de 1824, e aceitação pelo Supremo, no dia 27, da denúncia da Procuradoria Geral da República, com base em vasto inquérito da Policia Federal, contra o ex Presidente Bolsonaro e figuras do alto escalão do seu Governo, por tramarem contra o Estado de Direito Democrático. Doravante, são réus e se espera que todos os ritos processuais lhes sejam garantidos, sobretudo no tocante à presunção de inocência dos mesmos e ampla garantia de sua defesa.

Onde a conexão, tão distante destes dois fatos?

Na Constituição de 1824,  consagrou-se, como resquício do Absolutismo, o PODER MODERADOR do Imperador. Foi uma excrescência autoritária que acabou se ramificando em anos posteriores. Na Proclamação da República, este Poder foi extinto, mas acabou sendo assumido pelas Forças Armadas, sobretudo o Exército, que ganhara desenvoltura e protagonismo na vida política do país depois da Guerra do Paraguai. O “civilismo” de Ruy Barbosa jamais prosperou.  Desde então, militares  tiveram  papel preponderante no país, até o Governo  Bolsonaro, inclusive no período Vargas. Getúlio , em 1930, venceu a Revolução com o apoio dos “tenentes”, jovens oficiais que se rebelaram durante a década anterior (1920) contra a República Velha e que  se constituíram em lideranças estaduais com forte projeção nacional. Dividiram-se os militares ao longo da Guerra Fria (1947-1991) e acabaram intervindo,  em 1964, mantendo-se ferreamente no  Poder por 21 anos. Veja-se o filme “O dia que durou 21 anos”… Com a redemocratização na década de 1980, patrocinada pelo próprio regime, continuaram com alto poder de influência.

Mesmo a  Constituição de 88 , resultado do  caráter liberal daquele processo, absorveu a letra da Lei da Anistia de 1979, blindando os militares que acabaram como espécie de eminência “farda” do Poder Republicano. Seus acólitos sempre levantavam o famoso Art. 142 da Constituição como ameaça às Instituições.  Insatisfeitos, aliás, com a condução de Dilma Roussef (2011-2016)” na Comissão da Verdade”, que trouxe à público os crimes dos porões da ditadura, acabaram abraçando a eleição de Bolsonaro em 2018. Mas os tempos haviam mudado. A Sociedade Civil e as Instituições do Estado se fortaleceram muito nas quatro últimas décadas da redemocratização e resistiram à proposta do retrocesso fundada em argumentos esdrúxulos das Redes Sociais manipuladas e do Gabinete do Ódio instalado no Palácio do Planalto, senão da boca do próprio Bolsonaro.

O extremismo de direita, porém, não convenceu os brasileiros que acabaram derrotando-o em 2022. Faltava o episódio de 8 de janeiro de 2023 para entornar o caldo e reabrir o processo de abertura. E aconteceu, permitindo à Polícia Federal desvendar toda a trama golpista restauradora do autoritarismo,  urdida no Palácio do Planalto.  E felizmente , no dia 27 passado (março/2025), começamos a enterrar o “intervencionismo moderador”. Começamos a consagrar o império da Toga, através do Judiciário, guardião da Lei, sobre a Espada. Bolsonaro e sete de seu alto staff, um primeiro conjunto de um total de 34 indiciados, estão indiciados pelo Superior Tribunal Federal por conspiração contra a democracia  e  deverão, agora, se submeter a processo criminal grave. Dificilmente escaparão da cadeia. Uma lição não só uma para todos aqueles que se insurgem com prepotência contra o Estado, mas um novo marco na construção do regime republicano e no aprofundamento da democracia-entre-nós.

Penso que não foi uma vitória da esquerda, do Lula ou do PT. Foi uma vitória da democracia. E este processo, que se prolongará ainda por alguns meses, não será o passo o definitivo no rumo da estabilidade política da Nação. Ainda sofreremos sobressaltos, mas resistiremos.  A utopia, no nosso caso, democrática, como dizia Galeano, não é um poste de luz ao qual se chega e abraça, mas uma luz no horizonte que nos guia rumo a um mundo mais civilizado.  Viva a República!




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