OSSOS DO OFÍCIO (na praia Itapeva)

No ano de 1987, mais precisamente em junho deste ano, foram encontrados centenas de ossos humanos na praia da Itapeva. Um maquinista que estava terraplanando uma área na Itapeva encontrou alguns esqueletos quando tentava remover uma duna. A notícia correu rapidamente pela cidade e até pelo estado

19 de setembro de 2022

São ossos do ofício!

Quem nunca ouviu esse ditado popular?

Pois é, mas o que exatamente quer dizer?

Vamos ao oráculo…

O significado da expressão “ossos do ofício” remete para a realização de uma tarefa incômoda ou que implica um esforço extra na sua execução. Mas não pode ser abandonada pois faz parte do ofício, é uma obrigação.

Explicada a expressão, vamos ao fato.

No ano de 1987, mais precisamente em junho deste ano, foram encontrados centenas de ossos humanos na praia da Itapeva. Um maquinista que estava terraplanando uma área na Itapeva encontrou alguns esqueletos quando tentava remover uma duna. A notícia correu rapidamente pela cidade e até pelo estado, pois foi noticiada pela imprensa de Porto Alegre.

Pela cidade de Torres surgiram várias hipóteses, a primeira foi a de que ali seria um antigo cemitério indígena, mas foi descartada pelos mais antigos moradores da região. Outra delas é que aquilo seria uma “desova” de corpos. Os corpos estavam enterrados lado a lado e havia resquícios de tachas de latão, pedaços de pano e madeira. O que impressionou a polícia local foi que os crânios tinham arcadas dentárias com dentes em perfeito estado, inclusive com esmalte e manchas que pareciam obturações. O que os levou a pensar que poderiam ser indivíduos mortos há menos de 20 anos. Pensou-se, também, em pessoas envolvidas em crimes políticos e desaparecidos da metade da década de 1960.

E, por fim, a primeira hipótese, que já tinha sido rechaçada, voltou à tona!

O professor e autoridade em assuntos históricos, Dante de Laytano foi o primeiro que disse tratar-se de “restos arqueológicos”, segundo o professor há vários sítios arqueológicos conhecidos como “sambaquis” na região de Torres que foram estudados pelos maiores antropólogos brasileiros, inclusive o famoso Roquette Pinto.

Com a propagação da notícia dos “ossos na Itapeva” o promotor da cidade mandou abrir um inquérito policial e muitas pessoas foram ouvidas. Alguns ossos foram enviados para a polícia técnica em Porto Alegre a fim de serem melhor examinados.

Segundo informações do Sr. Atanagildo Martins da Rocha, seus tetra-avós, imigrantes portugueses, tiveram, em suas terras nos campos da Itapeva, o primeiro cemitério, entre os anos de 1760 e 1770. Havia muitos índios por ali e eles eram considerados inimigos pelos colonizadores, o que levava a muitas mortes. Os índios mortos eram enterrados neste cemitério, que funcionou, pelo que se sabe, até 1915. Pela descrição do Sr. Atanagildo, este cemitério ficava a 700 metros do mar.

A arqueóloga Jussara Louzada Becker, pesquisadora sócia-fundadora da SAB (Sociedade de Arqueologia Brasileira) especialista e mestre em História da Cultura Brasileira, moradora do litoral desde 1984, na época, garantiu que não era um sambaqui. Ao encontrar fragmentos de cerâmicas, pedras lascadas e ossos, a pesquisadora chegou à conclusão de que ali havia um cemitério. Em um livro publicado anos depois (2008), Jussara dá mais detalhes do que foi encontrado naquele local.

“Apesar do local estar completamente revolvido, decidiu-se escolher uma pequena área para um corte-teste (…). Na área ao redor, vários fragmentos de esqueletos, pedras lascadas e um lençol de conchas. Há presença de acampamentos da tradição Taquara e Tupiguarani (…). Os sepultamentos não pertencem à tradição Tupiguarani (…) podem ter origem na tradição de caçadores-coletores que habitaram a base do sambaqui raso, grupo pré-cerâmico”.

O mistério finalmente foi desvendado. Os ossos achados pertenciam a um antigo cemitério indígena que, aparentemente, foi soterrado pelas dunas ao longo dos anos, porém este achado rendeu muito assunto naquela época.

Muitos se envolveram em desvendar o mistério, outros nem queriam saber, mas enfim, eram os ossos de cada ofício envolvido!

 

Fonte: O homem pré-histórico no litoral norte, RS, Brasil, de Torres à Tramandaí, Jussara Louzada Becker. Torres, história em crônicas, Débora Fernandes, organizadora.




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