CONFUSÃO E AGRESSÕES NAS AREIAS DA PRAIA GRANDE: ‘Bate-boca’ em jogo de Beach Soccer feminino acaba em repressão policial

Caso polêmico ocorreu no último domingo, e jornal A FOLHA apurou os fatos buscando melhor entendimento da situação

20 de fevereiro de 2018

No último domingo (18), o que era para ser uma bonita manifestação esportiva nas areias de Torres, acabou tornando-se num incidente lamentável, envolvendo atletas, público e intensa ação policial. O fato  ocorreu no final de tarde na Arena da Praia Grande, no memento em que ocorriam as disputas da modalidade feminina do Campeonato Estadual de Beach Soccer.

Para contextualizar bem a situação, é preciso inicialmente destacar o cenário de certo descaso com o beach soccer torrense na atual temporada de veraneio – se comparado com anos anteriores. Já há alguns anos que não há arquibancadas para o público acompanhar o certame, e em 2018 nem os holofotes foram utilizados para a realização de jogos noturnos. Este cenário foi relatado por um desportista (que não quis se identificar) que há anos acompanha o Praiano nas areias da Praia Grande. Ele ainda relata a premiação ruim, a falta de banheiros nas proximidades (e decorrente falta de respeito do público, que urina nas dunas), a desorganização com o cronograma e falta de divulgação como mazelas do praiano de 2018 – e consequente desmotivação dos atletas.

Apresentado este panorama, vamos ao fato que gerou uma enxurrada de manifestações em Torres, ‘viralizando’ nas redes sociais. No domingo (18) as jogadoras de beach soccer tiveram de jogar uma partida no escuro, quando já não havia mais luz do sol (nem refletores que possibilitassem a partida noturna).  Pouco antes, uma rápida conferência foi realizada entre jogadoras e representantes da prefeitura (uma das organizadora do evento), incluindo aí Dérick Machado, Coordenador do Departamento de Esportes do município. Conforme repassado para o jornal A FOLHA por uma das atletas, as jogadoras teriam pedido para transferir a partida para outra data, mas uma vez que não houve consenso com a data proposta (um sábado de manhã, dia de trabalho para a maioria) a organização decidiu pela realização do jogo ali mesmo, apesar de a noite aproximar-se rapidamente. A decisão causou certa indignação, mas era necessário cumprir a tabela e a partida começou… sem entretanto conseguir ser terminada (pois o breu era total).

Mas o fato é que a problemática do campo logo passou para fora das quatro linhas. Enquanto a partida rolava, alguns espectadores e familiares das atletas fizeram reivindicações e reclamações ao coordenador de Esporte da Prefeitura. Houve bate-boca quanto ao descaso com o beach soccer (e em especial a modalidade feminina), e os ânimos teriam se exaltados na discussão. Sentindo-se acuado com a situação, Dérick Machado encaminhou-se até a Base Móvel Comunitária da Brigada Militar na Praia Grande. Conforme explicou ao Jornal A FOLHA, o coordenador de Esportes teria pedido aos dois policiais lá localizados para que estes “dessem uma olhada” no tumulto que, segundo ele, havia se formado nos arredores da Arena. Já alguns desportistas e representantes do público envolvido alegam que representantes da prefeitura teriam ‘incitado’ uma ação policial mais repressiva (mesmo que isso não tenha ocorrido de propósito).

 

Exageros policiais relatados

 

Entretanto, a dupla de policiais da Base Móvel Comunitária avaliou que a situação não poderia ser resolvida por eles apenas, e decidiu chamar reforços. Estes reforços prontamente apareceram – em grande quantidade, cerca de 20 policiais, conforme relataram pessoas presentes durante a ação. “Em razão do total despreparo, arrogância e falta de diálogo por parte da Brigada Militar, tivemos mulheres, atletas, admiradores do esporte e famílias com crianças e idosos sendo agredidos de forma covarde, desleal e desproporcional (pela BM)”, relatou a atleta torrense Flávia Lima, no Facebook (em postagem compartilhada mais de 85 vezes). Na confusão, entre outras agressões relatadas, uma criança teria sido atingida por um jato de spray-de-pimenta. Uma fonte citou que a ação policial em meio ao público da Praia Grande se assemelhava a “uma matilha de cães raivosos contra uma gangue perigosa”.

Mas o caso que mais teria chocado os espectadores foi o que envolveu a atleta Gláucia Ferreira, que havia disputado partida anterior, pouco antes da confusão começar. “Eu fui violenta e brutalmente agredida, tomei tapas no rosto, fui estrangulada, perdi a consciência praticamente e isso tudo sem fazer absolutamente NADA ou falar qualquer palavra. Além da incalculável vergonha, e indignação, estou arrasada, é um sentimento de tristeza tão grande que não cabe em mim. Isso porque, eu jamais, JAMAIS imaginei que os funcionários da instituição que devem primar pela segurança pública fossem capazes de fazer o que fizeram com todas as famílias ali presentes”, contou a própria Gláucia, em longo depoimento nas redes sociais. Pouco antes, (conforme disse ao jornal A FOLHA) ela tentava apaziguar os ânimos exaltados na confusão, e apenas teria se envolvido no tumulto por tentar tirar seu pai de lá.

Graduada em direito e atuando como assessora de juiz, a situação tornou-se ainda mais surreal para Gláucia quando ela, ferida, foi levada até a Delegacia de Polícia e viu uma queixa ser prestada contra ela, por uma das policiais que teria lhe agredido. “Inventaram xingamentos e agressões que eu de forma alguma cometi. Fui inclusive persuadida pela mesma policial para não fazer o exame de corpo e delito”, denunciou Gláucia, que continua: “Quem me conhece sabe que sou uma pessoa de boa índole, fui vítima de uma injustiça que não aceitarei nunca”, lamenta Gláucia, que também prestou queixa contra a truculência policial na Delegacia de Polícia e, posteriormente, apresentou denúncia do caso junto ao Ministério Público . Ela finaliza salientando que não pretende denegrir a imagem da Brigada Militar como um todo, nem sequer generalizar a truculência ocorrida no ato, apenas pretende “que os responsáveis sejam punidos”.

 

O posicionamento do Diretor de Esportes

 

O jornal A FOLHA também entrou em contato com Dérick Machado, Coordenador do Departamento de Esportes da Prefeitura de Torres e envolvido diretamente no incidente. Conforme relatado por Dérick, enquanto o último (e polêmico) jogo de domingo (18) ocorria às escuras, pessoas alteradas e possivelmente alcoolizadas foram até ele reclamar de forma ríspida. “Foram uns poucos da torcida que, desde o começo daquele dia, pareciam estar querendo fazer confusão. Eles foram nos cobrar e tentamos explicar (o porque do jogo ter que ser realizado naquele horário), mas a discussão seguiu”, explicou o Coordenadorde Esportes, que posteriormente – em meio a agressões verbais e empurrões –  teria se direcionado até a Base Móvel Comunitária da BM.  “Mas não houve solicitação (por parte do Departamento de Esportes) para que houvesse interferência tão repreensiva da Brigada Militar no caso. Pedi apenas para os policiais para ‘darem uma olhada’ no ‘tumulto’ que se formava nas proximidades da areia”, salientou.

Logo depois os policiais teriam chegado até a Arena, mas Dérick ressalta que a ação da BM ocorreu muito rápida, e ele não observou as agressões relatadas, uma vez que ainda estava atento ao jogo que ocorria na Arena. Entretanto, Dérick saiu em defesa da atleta Gláucia Ferreira (que foi teria sido agredida e conduzida até a delegacia após a confusão). “Dentro de campo, ela é uma pessoa educada, e até onde vi (antes da intervenção policial de domingo) ela estava tentando amenizar a discussão (que começava a esquentar)”.

O Coordenadorde Esportes ressalta que esteve a temporada inteira participando  ativamente não apenas em auxílio ao Praiano de Beach Soccer, mas de outros eventos realizados junto a orla torrense no verão. Para Dérick o campeonato foi exemplar dentro de campo, com partidas realizadas de forma leal e dentro do cronograma. A exceção teria sido o caso do último domingo, onde houve a interferência policial que gerou esta matéria.

O coordenador de Esportes da Prefeitura de Torres assumiu que, por questão de redução de custos e busca por diversificação das práticas esportivas, os gastos com o campeonato Praiano de Beach Soccer foram menores neste ano do que em edições anteriores. Entretanto, tendo em vista os problemas gerados ante a ausência de holofotes para a realização de partidas noturnas, a prefeitura deverá estudar a volta dos canhões de luz na Praia Grande para o ano que vêm.

 

Resposta da Brigada Militar de Torres

 

Em comunicado à imprensa divulgado na manhã desta terça-feira (20), o comandante da Brigada Militar de Torres, Fábio Hax Duro, expôs a posição da corporação policial sobre o caso de confusão na Arena de Beach Soccer. Sem entrar em detalhes sobre os fatos ou a citada truculência polical, o comandante da BM destacou que uma desordem entre torcedores teria levado à necessidade de uma ação policial mais vigorosa.  “A dupla de policiais que estava junto à Base Móvel Comunitária não foi suficiente para controlar (a desordem entre torcedores), necessitando chamar apoio. Os PMs que chegaram em apoio controlaram a desordem e, dessa ação, gerou-se reclamação da pessoa conduzida à Delegacia”, explicou Hax Duro.

Posteriormente contatado pelo jornal A FOLHA, o comandante Hax Duro acrescentou que teria sido acionado pelo Promotor da comarca local sobre o incidente na Arena de Beach Soccer – uma vez que a parte ofendida (Gláucia Ferreira)  fez reclamação. “O ministério público recolheu o termo de reclamação dela e me entregou em mãos, sendo que já comecei a adotar as diligências preliminares”, explica Hax Duro, que encaminhou a documentação para o Comandante do Batalhão (com sede em Capão da Canoa) – sendo que agora aguarda o parecer deste, que tem competência para realizar um procedimento formal. “As apurações estão sendo feitas, mas não podem ser reveladas (para não atrapalhar a investigação. O que posso salientar é que o caso vai ser investigado, e qualquer tipo de excesso será rigorosamente repreendido”.

 

Manifestação por ‘mais respeito ao futebol feminino’

 

Em resposta ao desagradável fato que ocorreu na Arena de Beach Soccer da Praia Grande, uma manifestação visando pedir “mais respeito ao futebol feminino” deverá ser realizada. O ato está previsto para a tarde de domingo (25/02) antes do jogo da final da modalidade feminina, na mesma Arena onde a confusão se instaurou no começo de noite do último dia 18. “Convocamos as equipes de futebol feminino e masculino da região, bem como os admiradores do esporte, para apoiar a causa, comparecendo e reivindicando juntos.O FUTEBOL FEMININO PEDE SOCORRO!”, destacou Flávia Lima, que propôs o manifesto em postagem no Facebook.


Publicado em: Policial






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