Maria Helena Tomé Gonçalves
Embora a gente sinta muito orgulho de ser brasileiro, há momentos, e muitos, nos quais um forte sentimento de indignação se apossa de nós, de todos aqueles que tem um certo nível de consciência social e de conhecimento do direito í igualdade em relação í s disparidades que acontecem no país. No mesmo momento em que o governo gaúcho alega não ter condiçíµes de cumprir a lei do piso salarial nacional para os professores, os sagrados juízes do mesmo Estado reivindicam auxílio moradia “ traduzida pelo próprio Judiciário para Parcela Autí´noma de Equivalência “ PAE, nascida de uma Lei Federal que equiparou os vencimentos dos deputados federais e magistrados. Entre 1994 e 1998 os deputados federais recebiam três mil reais de auxílio-moradia a título de se deslocarem de seus Estados para o exercício do mandato em Brasília (mesmo existindo os apartamentos funcionais destinados a eles). Agora nossos sagrados juízes estaduais querem receber “ e certamente receberão “ o pagamento retroativo desse auxílio, cujo montante ficará para cerca de novecentos juízes e/ou sucessores, em média de oitocentos e vinte mil reais per capta. Vale ressaltar que cada juiz gaúcho já recebe esse tal auxílio moradia embora não se desloque do Estado para o seu exercício profissional e sabe, de antemão ao fazer o concurso público, que deverá residir no município da comarca onde exercerá sua função de juiz, além de que seus salários já estão acima do teto máximo constitucional (recebem cerca de vinte e seis mil reais mensais).
Mesmo sendo muito ruim de raciocínio dá para perceber a enorme discrepância entre os três poderes brasileiros. Enquanto Legislativo e Judiciário se locupletam com altíssimos salários e uma variada gama de penduricalhos ditos legais, em nome de suas enormes responsabilidades sociais, em nome de seus altos níveis de estudo e conhecimentos exigidos pelos cargos (com exceção de certos cargos eletivos como deputados e presidente que até podem ser semialfabetizados), a maioria das categorias dos quadros do Executivo que também tem enormes responsabilidades sociais e altos níveis de estudo e conhecimentos, são pagos com salários miseráveis e cada vez que tem direito legal a aumentos determinados pelo nível de inflação do país ou outros índices e não aumentos reais de melhorias salariais, é preciso fazer greves, deploráveis greves, campanhas, batalhas, manifestaçíµes e toda sorte de açíµes para chamar a atenção sobre a necessidade de atualizar um pouquinho seus parcos salários. Os juízes e os deputados não precisam nada disso.
O próprio TCE “ Tribunal de Contas do Estado “ aponta o rombo que o pagamento retroativo do auxílio moradia dos juízes fará nos cofres do Rio Grande. í‰ inadmissível que o salário de um único juiz possa pagar o piso salarial de cerca de dezoito professores, que não tem direito a auxílio moradia e que também precisam sustentar suas famílias. E que também fazem concurso público. Além do mais o professor é aquela pessoa que cada vez mais cedo participa da formação das nossas crianças, as quais vão para as creches e escolinhas cada vez mais cedo. Esses professores lidam com o que é mais precioso num país “ a infância. Por isso precisam de muito estudo, de uma ótima formação e merecem uma boa remuneração pelo seu trabalho. Questiono se a responsabilidade social do juiz é assim tão mais relevante que a do professor. Ressalte-se que não teríamos juízes sem professores. Mas acho que os juízes e os deputados dessa geração que está aí não tiveram bons professores de Educação Moral e Cívica do tempo da Ditadura, pois suas reivindicaçíµes, se não são ilegais, são imorais e vergonhosas. Talvez porque os tais professores de Moral e Cívica não eram professores de carreira, mas pessoas da comunidade nomeadas pelo Governo, entre elas, padres e juízes. Conceda-se auxílio moradia retroativo para os pobres juízes e que danem-se os professores, os médicos, os soldados, os bombeiros…