Uma cidade não se conta apenas por suas datas, documentos e acontecimentos, conta-se também por suas formas. A arquitetura de um lugar é expressão concreta daquilo que se sonhou, planejou e viveu em cada época. No caso de Torres, a história das sedes da Sociedade dos Amigos da Praia de Torres – SAPT é um recorte precioso da evolução urbana e estética da cidade, acompanhando seus ciclos de desenvolvimento, as transformações da sociedade e os reflexos de influências externas que moldaram sua paisagem.
Como bem aponta a arquiteta Marione Otto, “a cronologia das construções das sedes da SAPT, de certa forma, reflete a história da evolução da arquitetura do Litoral Norte, especialmente pelo estilo adotado por cada um dos edifícios desde o surgimento da agremiação”.
O primeiro espaço, já relembrado neste projeto, foi o Abrigo da SAPT, construído em 1938. Situado à beira-mar, no coração da Praia Grande, o abrigo foi inspirado nas referências de balneários internacionais como Mar del Plata e Miami, e trazia traços do Art Déco — estilo que florescia na década de 1930 e se traduzia em linhas geométricas, formas robustas e uma elegância funcional. Seus arquitetos, uruguaios, trouxeram uma leitura moderna para a época, integrando o edifício à paisagem natural e urbana da orla. O abrigo era ao mesmo tempo prático e simbólico: um espaço de acolhimento, sociabilidade e visibilidade.
A sede seguinte, o Edifício Amigos de Torres, foi idealizada na década de 1940 com pretensões ainda mais ambiciosas. Planejava-se um hotel com apartamentos e área social, inspirado em um “magnífico hotel de Miami”. A proposta era clara: alçar Torres a um novo patamar, de balneário de elite à altura das estâncias internacionais. Embora o projeto original tenha sofrido adaptações ao longo do tempo, ele marca um momento de desejo de sofisticação e expansão — tanto para a cidade quanto para a SAPT. A própria escolha por um modelo estrangeiro revela a influência das tendências urbanas do pós-guerra e o fascínio pelas referências norte-americanas que passaram a pautar o imaginário coletivo no Brasil daquela época.
Já nos anos 1960, uma nova sede foi construída, desta vez próximo ao Rio Mampituba e a Praia dos Molhes, que na época ainda nem contava com os molhes que mais tarde modoficaria ainda mais a paisagem desta parte da cidade. A edificação traz elementos do modernismo brasileiro, com linhas retas, grandes janelas de vidro e integração com o entorno urbano. Essa sede, inaugurada em 1965, é considerada um marco da consolidação da SAPT como uma instituição não apenas de veraneio, mas de forte atuação cultural e social ao longo de todo o ano.
O prédio, embora discreto em sua ornamentação, traduzia a nova visão de cidade em crescimento e a busca por funcionalidade e acolhimento. Os espaços internos foram pensados para receber bailes, festas comunitárias, reuniões e atividades diversas para sócios e convidados.
Essa sede permaneceu como coração da SAPT por décadas, sendo ampliada e adaptada conforme as necessidades da associação e os desejos dos associados. Hoje, a sede social ainda pulsa como um espaço de encontro intergeracional, guardando na própria estrutura as marcas das décadas de vivência que abriga.
O complexo esportivo, melhorado para as atender as necessidades dos anos 2000, traz uma nova linguagem arquitetônica — mais voltada à funcionalidade, acessibilidade e sustentabilidade. Um projeto que dialoga com o presente e com os novos hábitos urbanos, oferecendo à comunidade um espaço de prática esportiva, convivência e qualidade de vida.
Cada uma dessas construções carrega, em sua linguagem arquitetônica, os desejos de sua época: do glamour balneário ao espírito modernista, da influência internacional à valorização das práticas locais. São expressões físicas de um mesmo sentimento, o de pertencimento, identidade e cuidado com a cidade.
Olhar para as sedes da SAPT é, portanto, mais do que olhar para prédios: é contemplar os reflexos de uma cidade em movimento, onde o tempo não apaga as memórias, mas as transforma em alicerces para o futuro.
Como diz a arquiteta Marione Otto, “quando resgatamos a história da arquitetura da SAPT, não estamos apenas falando de estilos, mas de escolhas culturais, sociais e afetivas. É a memória construída em tijolos, linhas e horizontes.”
Que sigamos atentos aos contornos da nossa cidade. Porque onde há forma, há história, e onde há história, há vida.
