Sou persistente. Todos os anos, desde 2013, trago aos leitores desta coluna em A FOLHA , na expectativa que ecoe por todas as curvas do Mampituba, minha mensagem de BOAS FESTAS através da evocação do “Advento”.
O “Advento” é o período de quatro semanas, na tradição cristã, que antecede o Natal. A cada semana, acende-se uma vela nesta vigília de forma que, no Dia de Natal, quatro delas nos iluminem. Trata-se de um período de reflexão, na expectativa da “Boa Nova” como mensagem de paz e amor a todos os homens, sem distinções, como ensinou São Paulo em suas Epístolas, nas quais fundiu a fé com os ensinamentos filosóficos gregos. Por isso se diz que o Cristianismo é uma confissão que nasceu abençoada pela Razão e pela Liberdade. E daí a sagrada egrégora greco-cristã que nos envolve no Ocidente. É um momento de preparação para a reunificação, não só das famílias, mas de todos os povos do mundo, sem rancores , sem preconceitos, sem outro sentimento senão aquele ocupado pelo Amor. A grande ceia do Natal não é senão um ritual iluminado que contribui para quebrar o cotidiano e gris da vida diária, um artifício para a ritualização da concórdia entre-todos-nós: O Encontro. Voltamos todos para casa porque é no amplexo familiar que renovamos as energias para enfrentar as adversidades do novo ano que se anuncia na fatia dos tempos.
Vivemos, por certo, momentos difíceis na História Contemporânea, independente de nossas venturas e infortúnios pessoais. . As esperanças de um mundo melhor parecem soterradas na multiplicação sem par da miséria, resultado da extrema concentração da riqueza, na destruição do Planeta, na disseminação do vício e confrontos religiosos, étnicos e políticos. A depressão emocional, enfim, esta epidemia irrecorrível do século XXI, parece ser o sintoma do desarranjo dos homens.
O Advento contribui para reforçar a resistência no bom caminho da virtude. O homem, enfim, é o começo e o fim de tudo. Resistamos, pois, ao fim da virtude. Ainda há tempo, mas urge. É preciso coragem, determinação e bom senso. Resistir, não só por orações, mas ações. Dois padres católicos se notabilizaram no Período Colonial em suas pregações no Advento: Frei Antonio de Montesinos e Padre Vieira, cada qual mais pungente do que o outro.
Frei António de Montesinos, em Santo Domingo em 21 de Dezembro de 1511, no quarto domingo do Advento entrou para a história como o primeiro pronunciamento em defesa dos Direitos Naturais e Humanos dos índios das Américas. Inspirou também o Frei Bartolomeu de Las Casas a elaborar as chamadas Leis Novas, decretadas pelo Rei Carlos I da Espanha, para tentar protegê-los das brutalidades praticadas pelos conquistadores na sua insaciável busca por riquezas e ouro.
“Todos vós estais em pecado mortal. Nele viveis e nele morrereis, devido à crueldade e tiranias que usais com estas gentes inocentes. Dizei-me, com que direito e baseados em que justiça, mantendes em tão cruel e horrível servidão os índios? Com que autoridade fizestes estas detestáveis guerras a estes povos que estavam em suas terras mansas e pacíficas e tão numerosas e os consumistes com mortes e destruições inauditas? Como os tendes tão oprimidos e fatigados, sem dar-lhes de comer e curá-los em suas enfermidades? Os excessivos trabalhos que lhes impondes, os faz morrer, ou melhor dizendo, vós os matais para poder arrancar e adquirir ouro cada dia… Não são eles acaso homens? Não tem almas racionais? Vós não sois obrigados a amá-los como a vós mesmos? Será que não entendeis isso? Não o podeis sentir?».
O Pe. Vieira, igualmente combativo e brilhante, não deixou por menos e, por isso, teve que se explicar à Inquisição.
Infelizmente, povos originários, em nosso país, continuaram e continuam sendo mortos e dizimados, expropriados de suas terras. A eles somaram-se na penúria, durante quase quatro séculos, 4 milhões de escravos trazidos sob tenazes da África, além dos que pereciam nas tormentosas viagens. Cenas horrorosas são vistas no filme “Amistad”.
Ficção, memoralismo e História nos aguçam a sensibilidade. Dê livros de presente neste Natal.
Nossa modernização no século XX substitui, com efeito, o sujeito-objeto da colonização pelo objeto-sujeito das grandes metrópoles, nas quais ainda moureja, em condições sócio-econômicas indignas, metade da nossa população: 50 milhões vivem com um salário mínimo, outro tanto com meio e mais 20 milhões nada têm senão o destino das ruas. Tudo isso nos faz meditar, nesse tempo do Advento. Estamos na véspera de um novo ciclo eleitoral quando poderemos, mais uma vez, escolher o melhor caminho para todos os brasileiros, com respeito aos Direitos Humanos, celebrados anualmente nesta data de 10 de dezembro, e às oportunidades de realização social, com a retomada do desenvolvimento. Reflitamos juntos e decidamos em paz. Enquanto é tempo…