Acabou! A palavra saiu da boca do Presidente Bolsonaro aos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no final da tarde do dia primeiro de novembro (2022). Já a essas alturas as estradas começavam a ser obstruídas por seguidores seus, inconformados negando as urnas. Todos conhecem a fábula do médico e o monstro, que assombra, inclusive, hoje, os cientistas com medo da revolta dos robôs humanizados. Bolsonaro criou o bolsonarismo e parece ter chegado um momento em que nem ele o controla mais. Virou uma distopia à solta a serviço da irracionalidade contra a realidade da Lei, da Ordem e das instituições. No dia 2, Finados, várias capitais foram ocupadas com fileiras de gente rodeando quartéis, clamando por intervenção militar contra o resultado das urnas.
Diante disso proliferaram notas de diversas entidades da sociedade civil exigindo providências das autoridades para conter a irrupção antidemocrática. Assim o fizeram 186 Procuradores da República que exigiram pronunciamento do Procurador Geral da República, afinal levado ao ar. Entidades representativas de policiais federais, policiais rodoviários federais condenaram igualmente o movimento, bem como associações nacionais representativas de caminhoneiros. Empresários, enfim, também se manifestaram evidenciando os prejuízos já registrados pelo desabastecimento, afora problemas de oxigênio e medicamentos em hospitais. Mais um vez, então, o Presidente foi instado, por conselheiros e sociedade, a se manifestar com mais clareza e condenação aos caminhoneiros. Fê-lo no início da noite do mesmo dia 2. Pediu que desobstruíssem as estradas. Na verdade elas já vinham sendo desobstruídos por forças estaduais, depois de autorizadas pelo Supremo, não só pela multa de R$ 100 mil reais aos recalcitrantes, como até pelo uso de forças de choque. Na manhã do dia 3, entretanto, um balanço da Polícia Federal ainda mostrava mais de cem pontos de obstrução.
Isso demonstra que o movimento corre o risco de ultrapassar seu criador, que tentará, na planície, recompor sua liderança. É certo que não tem ele, por exemplo, a força de um Trump, montado numa grande fortuna pessoal e no prestígio junto a um dos dois maiores Partidos americanos, o Republicano. Mas Bolsonaro demonstrou capacidade de penetração popular e não é impossível que ainda venha a ter algum protagonismo nacional. A dúvida que paira no ar é o destino não dele, mas da sua criatura: o bolsonarismo. Permanecerá sintonizado com “O Chefe”, ou se dispersará em torno de novos líderes, mesmo de direita, que doravante pontificarão no Congresso Nacional e nos Estados? Qual o elo de ligação entre os vários componentes deste bolsonarismo e os 58 milhões das urnas? Parte destes votos, influenciados pelo Pacote de Bondades do Governo, refluirá para o novo Governo Lula? Muitas perguntas, poucas respostas. Só o tempo as ditará.
Enquanto isso muitos se perguntam sobre a recuperação da normalidade nas estradas e nas cidades. Haveria alguma chance real de golpe militar? A resposta é um rotundo NÃO! O Brasil passou da era da moderação, feita pelo Imperador na época do Império, substituída pelo Exército que o derrubou no 15 de novembro de 1889 e que, de uma ou outra forma, de um lado e de outro, definiu rumos para o país e se prolongou até 1985 para um novo patamar civilizatório: O Império da Lei. Na Proclamação precisamos de um Deodoro; em 1955 de um General Teixeira Lott, que garantiu a posse de JK; em 1974 de um General Geisel com seu projeto de “Lenta, Segura e Gradual” redemocratização. Agora tivemos como Xerife um Ministro da Suprema Corte, Alexandre Moraes. Sinal não só dos tempos, mas de tempos de mudança. De nada adiantará estimular as vivandeiras de quartéis em busca de intervenção. O civilismo, tão apregoado, sem êxito, por Ruy Barbosa, vingou. A Constituição será obedecida. A normalidade da Lei restituída.
O que se espera, pois, é um refluxo dos ressentimentos cultivados durante o pleito e uma autocontenção dos dois lados. Nem soberba dos vitoriosos, que oxalá se comportem como prometeram na campanha, como um governo de transição sem afirmações polarizadas, nem intolerância dos vencidos, que devem se preparar para um novo embate democrático em futuro próximo. Que a harmonia, enfim, volte a reinar na imensa família brasileira povoada de tantas diferenças étnicas, culturais e políticas, mas vestida orgulhosamente pela mesma bandeira. VIVA O BRASIL!