A existência de ricos e pobres é uma constante desde primórdios da humanidade e decorre de vários fatores, dentre as quais, a maior capacidade de alguns para imporem sobre outros, mais vulneráveis, seu domínio, muitas vezes acompanhado da prática de crueldades, agravando a distância social. Os vencidos nas guerras eram transformados em escravos. Os mais frágeis, internamente, ao abuso pelos mais fortes até que o Direito se instituiu como regra de equalização social. Na Roma Antiga o Pater Familiae tinha o poder de assassinar até a própria família. A escravidão, aliás, que alimentou o patriarcalismo, foi a mais brutal forma de dominação. Atravessou séculos. Deixou rastros… Ainda no século XIX sobrevivia no Brasil – e não raro emergem notícias de descoberta de cativeiros nos quais os trabalhadores são submetidos a condições similares à escravidão –e alcançava entre 1/3 e metade da população. Viajantes ilustres deixaram o testemunho da barbárie deste sistema no Brasil, muitas vezes romantizada sob o manto da idealização do Império, regime retrógrado, odioso e de “decrepitude moral”. Charles Darwin após sair do Brasil escreveu: “Nunca mais ponho os pés em um país escravocrata! No Recife um jovem mulato era constante e brutalmente espancado pelo seu senhor. Até hoje, quando escuto um grito na madrugada penso que é um escravo brasileiro e tremo todo. Em Salvador e no RJ as donas de casa tinham tarraxas para esmagar as articulações dos dedos dos escravos domésticos. E aos domingos iam à igreja, onde diziam amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”.
O século XX deu uma trégua às injustiças sociais, apesar de que assistiria, ainda, a brutalidade do neocolonialismo sobre Asia e África, com inúmeros casos de genocídio, como no Congo e Armênia, não raramente desembocando em convulsões e revoluções sociais. Duas grandes guerras mundiais, enfim, com um saldo de mais de 100 milhões de mortos obnubilaram, também, os eventuais avanços que culminariam na consagração da Doutrina dos Direitos Humanos sob a égide da ONU. As décadas finais, entretanto, do século XX, reconfigurariam a Economia e o Pacto Social arduamente conquistados no pós-guerra. . Adveio a globalização sob o controle de uma moeda sem lastro e que acabou se oferecendo como instrumento de um jamais visto processo de acumulação estritamente financeiro. Desde então, o desenvolvimento, mesmo no centro do sistema global, acabou girando em torno de uma ciclópica especulação financeira que acaba inibindo a disseminação do progresso técnico sobre o sistema produtivo e restringindo as possibilidades de redistribuição de seus benefícios entre lucros e salários, acompanhada de crescentes dificuldades para o financiamento do setor público. Os capitais volatilizados em escala mundial sem precedentes exigem ampla liberdade para seu movimento com o mínimo de ônus social sob a alegação de que se constituem na mola propulsora dos investimentos. (?) A consequência, no mundo inteiro tem sido a crescente concentração de renda, pela qual 1% do das pessoas controla os 99% restante com o agravante de controlar os ativos disponíveis e ainda por cima gerar o maior volume de gases tóxicos sobre o meio ambiente.
Diante disso, cresce a consciência da necessidade de se mudar de rumos. Urge a montagem de uma sólida e efetiva Política de Combate à Fome e Pobreza em escala planetária e criação de mecanismos globais de financiamento público para esta tarefa. Este foi o sentido da exposição, quarta-feira (28), do Ministro Haddad ao encontro dos Ministros de Economia dos principais países do mundo, reunidos no Rio, em preparação ao ENCONTRO DOS CHEFES DE ESTADO do G20, em novembro próximo. Muitos países, analistas e até mesmo grandes empresários já se sensibilizam diante do atual cenário social contemporâneo, dispondo-se a pagar a conta desta mudança de rumos. Milionários até divulgaram uma carta pedindo para pagar mais impostos, assinada recentemente por abastadas pessoas de 17 países, entre os quais a herdeira do império Disney, Abigail Disney; o ator e roteirista Simon Pegg; Valerie Rockefeller, herdeira da dinastia de sua família; Ise Bosch, neta do industrial alemão Robert Bosch e o músico e compositor Brian Eno, a qual se associou o brasileiro João Paulo Pacífico.
Isso demonstra que a exigência por uma Política de Eliminação da Miséria no mundo e maiores impostos em escala global sobre os mais ricos nada mais é do que uma reivindicação, além de humanista, civilizadora.