OPINIÃO – O NATAL (e além dele)

Que o Natal ilumine, pois, nossas consciências no sentido da Boa Nova como amor ao próximo. Esta a principal mensagem da data. “Por isso uma força me leva a cantar”...

24 de dezembro de 2022

Chegamos ao Natal. Ano 2022, significativo para o Brasil por celebrar seu segundo centenário da Independência numa renhida disputa eleitoral que acabou se traduzindo como uma vitória dos valores democráticos e republicanos.  Há cem anos, em 1922, abrimos um ciclo de grandes mobilizações que acabaram desembocando na Revolução de 1930. À sua testa, Vargas mudou o Brasil de um país agroexportador, herdeiro da escravidão negra, para um moderno país estruturado por instituições estatais fortes voltadas à industrialização e à afirmação da soberania nacional.

Vamos ver o que nos espera a seguir. Pesquisas de Opinião demonstram que queremos mais soberania popular e mais desenvolvimento.  Enquanto isso, confraternizemos entre os sobreviventes de um período difícil  que se mostrou mortífero para quase 1 milhão de brasileiros que pereceram sob o COVID; mais de 20 milhões ainda padecem diante da crise econômica e cerca de 33 milhões de famintos nada terão à ceia de Natal, senão esperança de dias melhores. E nunca esqueçamos que 120 milhões de brasileiros, ativos e inativos, ganham até um salário mínimo. A eles, todos, nossa solidariedade e expectativas de que um dia possamos gritar a todos os cantos que Torres é um exemplo para o Brasil: uma bela cidade na qual quase ninguém padece de fome, quase nenhuma criança está fora da escola, nenhum adolescente desamparado como nem-nem, nenhum idoso abandonado. Afinal, não é esta a Boa Nova de Cristo inscrita nos evangelhos? Evangelhos que se constituem na ruptura com o Velho Testamento judaico e que enfatiza a ideia de que “Deus é Pai”, do qual todos descendemos, sem distinção, como irmãos. Foi São Paulo, aliás, quem consagrou esta  máxima como fundamento da fraternidade universal e que levaria, no Renascimento, à compreensão da dignidade humana como princípio da Doutrina dos Direitos Humanos, reiterada na Declaração dos Direitos do Homem na Revolução Francesa, em 1789, ratificada pela Declaração dos Direitos Humanos pela Organização das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, depois da vitória Aliada contra a ameaça da extrema direita  nazi-fascista. O cristianismo, como outras doutrinas religiosas que o precederam, como o zoroastrismo, entre os persas, e o budismo, entre os hindus, são todos igualmente humanistas e rejeitam as discriminações e uso da violência contra um suposto “Outro”. Em todos eles germina o cultivo do perdão em substituição à vingança e a prática da concórdia como regra de convivência.

Importante, pois, lembrar neste momento Natalino, que para o cristianismo que tem na Bíblia seu livro sagrado, há um Velho Testamento, um conjunto de 39 livros escrito originalmente em hebraico, com exceção dos trechos bíblicos que foram escritos em aramaico : Ed 4. 8-6, 18; Ed 7. 12-26; Dn 2. 4-7, 28 e Jr 10. 11  e o Novo Testamento, escrito majoritariamente em grego, com 27 livros,  consubstanciado nos Evangelhos com ensinamentos de Jesus Cristo, nos quais esta ideia do amor ao próximo se destaca, abrindo caminho na Idade Média para reformadores sociais como Joaquim de Fiore (1135 – 1202)  e John Huss ((1396 -1393), os quais  acabariam irrigando os ideais do Iluminismo no século XVIII. Das escrituras nessas línguas originais surgiram as traduções bíblicas em diversas línguas faladas pelo mundo. Hoje calcula-se que 100 milhões de exemplares da Bíblia já tenham sido impressas, sendo o livro mais lido no mundo. A tradução para a língua inglesa foi feita por William Tyndale (1484 – 1536) coincidindo com a criação da Imprensa por Guttemberg, tendo ele próprio feito  180 cópias,  135 em papel e 45 em pergaminho, muitas ainda guardadas em museus.

Quatro foram os evangelistas:  Marcos e  Mateus, primeiro e mais tarde  Lucas, supostamente o mais bem  escrito e que teria se informado com Maria e outros parentes de Jesus e, finalmente,  João, para quem “No princípio era o verbo”;  Verdade, também, que o Novo Testamento foi o resultado do Concílio de Niceia – 325 DC, realizado sob a égide do Imperador Constantino, o qual conduziu à seleção dos textos ali subsistentes até hoje, estigmatizando os “apócrifos” que acabaram  excluídos da tradição cristã e  conduzindo à proliferação de seitas condenadas pela Igreja.

De outra parte, o cisma da Reforma Religiosa no século XVI, seguido da expansão do cristianismo para o Novo Mundo, África e Asia traria novas inspirações ao cristianismo. O neopentecostalismo norteamericano, por exemplo, revaloriza o Velho Testamento, fenômeno que se estende às confissões brasileiras que os combinou com práticas da matriz africana num peculiar modelo de valorização individualista. De resto, um rico sincretismo do cristianismo com outras tradições religiosas nos territórios ocupados pela colonização europeia irá nacarando sua matriz original, sem contudo desfalecer em sua mensagem humanística.

Que o Natal ilumine, pois, nossas consciências no sentido da Boa Nova como amor ao próximo. Esta a principal mensagem da data. “Por isso uma força me leva a cantar”…

 

 




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