O processo eleitoral correu satisfatoriamente no Brasil, apesar das manipulações dos fakenews, não restritas ao nosso país. Vamos ter que aprender a lidar com isso no futuro. Uma constatação positiva: Parece que demos um fim as campanhas milionárias financiadas com desvio de recursos públicos.’
Quanto aos resultados, demonstram que o país é bastante dividido entre esquerda x direita. Nas últimas eleições , de 2002 a 2014, a maioria ficou com a esquerda. Desta vez, ficou com a direita, ou o que se parece com um e outro, com o que diferencia um do outro enquanto Projetos para o Brasil. . O país, enfim, está dividido ideologicamente, o que não é ruim, como muitos pensam. Ruim é a intolerância e pior ainda o recurso à violência na defesa das posições. Ainda chegaremos ao ponto em que estão Portugal e Chile, onde as diferenças, profundas, são partes da vida pública.
A direita, porém, sofreu maiores traumas do que a esquerda.
Vejamos:
A hegemonia da direita voltou aos setores mais afinados com o discurso autoritário, praticamente destroçando o PSDB, que desde 2004 se afirmara sobre velhas lideranças oriundas do regime militar. Agora esfacelou-se, ainda que com a eleição de Dória em S.Paulo e E. Leite no RS, ambos afinados mais com Bolsonaro do que com FHC.. Foi a consequência da falta de um ajuste de contas mais profundo com os crimes daquele regime. Tergiversamos demais. Acresça-se ao desempenho pessoal de Bolsonaro neste processo, encarnando não apenas uma imagem de anti-sistema, mas também sua articulação com grandes massas evangélicas afinadas com sua defesa da família tradicional e valores conservadores, a emergência de dois Partidos de direita, o Novo, de Amoedo, e o PSL, do próprio Bolsonaro, com uma bancada que tenderá ser a maior da Câmara dos Deputados – podendo chegar a 70 deputados – e alguns Governadores de importantes Estados, mormente Minas Gerais. Calcula-se que terá maioria folgada para fazer, inclusive, mudanças constitucionais.
A esquerda, ampliada além dos votos em Haddad no primeiro turno, entretanto, mesmo derrotada, sai vitoriosa, com amplo apoio em margem considerável do eleitorado brasileiro.
Segue, nesta “esquerda”, a hegemonia do PT , tendo feito uma grande bancada- 56 deputado – na Câmara e reafirmando seu controle, junto com PCdoB no Maranhão e em vários Estados do Nordeste, o mais importante deles Bahia. Quebrou a cara quem imaginou que a LAVAJATO destruiria o PT. Abateu, sim, algumas lideranças, mas o Partido vai dar trabalho por muitos anos, distante de Haddad, a quem foi oferecida a Presidência do Instituto Perseu Abramo…
O PDT e Ciro Gomes cresceram no cenário nacional, mas falta-lhes maior envergadura orgânica interna e de relações com a Sociedade Civil e Inteligência nacionais para disputar com o PT a liderança na Oposição. Não obstante, tudo indica que Ciro se preservou para tentar voltar em 2022 como um candidato viável. O PSB poderá ter um novo papel, com eixo no Estado de Pernambuco, provavelmente em aliança com PDT, Marina, PPS e alguma outra agremiação de centro esquerda que emerja neste processo. Já surge no horizonte, também, uma Frente Democrática de Oposição a Bolsonaro, integrada não por Partidos, mas personalidades nacionais, abrindo-se, com isso, dois caminhos para a esquerda: Resistência ao que entendem como fascismo em processo, defendida pelo PT, e Oposição Democrática, por parte dos que têm uma análise de que o curso é de autoritarismo radical, mas com sobrevivência de brechas institucionais, seja no Congresso, seja na Justiça.
Entre as causas do fracasso de Haddad também dois entendimentos. Para o PT e aliados houve manipulação do processo desde o impeachment de Dilma, culminando na prisão de Lula e seu impedimento à candidatura, além da enxurrada da fakenews financiados ilegalmente por grandes empresas. Para outros, mais inclinados, agora, à criação da mencionada Frente Democrática, houve erro de Lula e PT ao insistirem com candidatura própria. Explicam: Com o deslocamento da hegemonia da direita para um extremo francamente autoritário e a incapacidade do PT em construir uma Frente Democrática, com participação de liberais, empresários e classes médias, capaz de lhe fazer frente com folga competitiva, confundiu-se o sentimento anti-sistema com o anti-petismo, debilitando a alternativa HADDAD.
Confirmado Bolsonaro, há apreensões generalizadas, tanto do Mercado, quanto das opiniões externa e interna, sobre seu curso e estabilidade. Poderá, ainda, aprofundar o autoritarismo legal no sendeiro do Lawfare, que hoje vai se identificando com um novo tipo de Estado de Exceção, ou , simplesmente fazer um governo errante, tropeçando nos seus próprios passos. Sua ideologia é difusa, devendo oscilar entre sentimentos arraigados de nacionalismo militar, que impõe um mínimo de soberania em decisões estratégicas e corporativas e um vago liberalismo. Deverá, coerente com sua formação militar, a ser fortemente centralizador, sem, contudo capacidade política – técnica e administrativa – para operar como árbitro de decisões conflitantes de seus colaboradores. Resta, neste processo , saber quem o influenciará, à falta de ideologia, partido, colaboradores articulados. Aqui duas vertentes: A família e o próprio Exército. Até que ponto, por exemplo, esta instituição tolerará afundar-se em sua boa imagem na sociedade em decorrência da instabilidade de Bolsonaro? Não creio, pessoalmente, que as Forças Armadas aceitem ser levadas à qualquer aventura golpista.
Quem viver verá…. VIVA A DEMOCRACIA!