A grande notícia da semana que passou foi a aprovação, em primeiro turno, na Câmara dos Deputados, na calada de uma noite pouco primaveril, da denominada PEC 23, dos PRECATÓRIOS, por 312 votos, 4 a mais do que o necessário para mudanças na Constituição. Foram, aliás, decisivos, neste processo, 15 votos do PDT, supostamente de Oposição, com uma candidatura à Presidente na rua , de Ciro Gomes, francamente contrário a Bolsonaro. Consta, aliás, que a votação dos pedetistas, outrora chamados brizolistas – mas quem lembra, neste país de memória curta!? – indignou a tal ponto Ciro que ele estaria exigindo uma mudança de posição da bancada na segunda votação da referida Emenda, sob pena de retirar seu nome à corrida presidencial. Haverá sinceridade nisso? Quem sabe? Há alguns dias se fala nos bastidores que Ciro Gomes estaria já contrariado com o Partido que ora o abriga, depois da passagem anterior por outros sete e que pode aproveitar “o ensejo” para trocar de sigla. Analistas não escondem que ele seria um candidato ideal no PSD de Kassab, deslocando a candidatura já lançada do Presidente do Senado, recém filiado a este Partido, que seria contemplado com a disputa às Alterosas. Fiquemos, pois, na expectativa: Como será a segunda votação da PEC dos Precatórios na Câmara, indispensável à Emenda Constitucional, e como o Senado, que tem operado como freio da impetuosidade bolsonarista da Câmara, tratará a matéria? Lá repousam outras Emendas à espera de um difícil consenso numa Casa afetada pela CPI do COVID, tal como a da mudança no ICM.
De tudo isso, uma indagação: O que são Precatórios e o que esta conflitiva PEC representa.
Muito simples – e todos os professores o sabem há anos -: O Precatório é um título de reconhecimento de dívida expedido por qualquer dos entes federados – União, Estado ou Município – em obediência a uma decisão judicial favorecendo tanto pessoas físicas como jurídicas, podendo estas serem públicas ou privadas. Os exemplos se multiplicam: Ora é uma dívida trabalhista, ora um direito sonegado, ora uma desapropriação de propriedade por interesse público a preço não aceito, tudo judicializado e submetido à décadas até o julgamento final. Ainda assim, depois da sentença, inicia-se outra travessia tortuosa: a execução da sentença, sempre obrigatoriamente submetida à infindáveis recursos do devedor. No final, o último golpe: Os respectivos governos obram por pagar apenas o valor incontroverso subjacente à execução. Aí, então, emite um título de crédito, o Precatório, que ainda será inscrito oportunamente no Orçamento para pagamento no próximo ano. Tudo isso pode levar décadas e o feliz detentor do título celebrará, já velho, com a família com estas nobres palavras: “ A Justiça tarde mas não falha”. Aí vem o Governo e decreta “moratória”…Outro exemplo, são Estados e Municípios que judicializaram – foram à Justiça – em busca de direitos sonegados pelo Governo Federal e seguem os mesmos ritos e expectativas que os interessados privados. No caso em pauta, em que o débito dos Precatórios para 2022 montam em R$ 79 bilhões, só o FUNDEF, que seria usado, inclusive, por Prefeituras para pagamento de professores, tem ¼ deste valor.
Agora, as razões desta PEC: O Governo quer ampliar o novo Bolsa Família com outro nome, de forma a desvencilhá-lo da origem petista, para 17 milhões de beneficiários, com valor de R$ 400, e não tem recursos orçamentários. Com isso espera reforçar o apoio das populações vulneráveis à reeleição de Bolsonaro. Então imaginou este expediente: Dar um calote nos Precatórios. Disso se trata. Simples assim: Simplex.
A só noticia, há algumas semanas, desta hipótese deixou o Mercado Financeiro de cabelo em pé. Quando um governo começa a dar calote, sempre começa por mais vulneráveis e acaba dando calote amplo, geral e irrestrito. Eles se lembram da máxima do avô do Presidente do Banco Central, Roberto Campos: “Não há moedas (títulos) podres; há governos podres”. Foi um auê que se refletiu nas bancadas, também advertidas por seus respectivos Prefeitos do risco de perderem o FUNDEF. Daí o esforço de guerra do Presidente da Câmara, Arthur Lira, para aprovar rapidamente a matéria, o que, afinal conseguiu em primeira votação. O resto da estória, todos sabem, já falei no começo desta coluna. É esperar para ver, mas me pergunto se, isso posto, não seria de se esperar, também, que o Congresso aprovasse uma moratória para os 63 milhões de endividados, muitos com ficha suja, penando no desemprego e no arrocho salarial. Seria uma espécie de contrapartida: Se o Governo não paga as suas dívidas porque diz não ter dinheiro, por que não liberar geral também às pessoas físicas e pequenas empresas…?