DIÁRIOS DE MOCHILA – Retornando a Jericoacoara

Buenas! Na última edição, meu relato falou sobre minha volta para o sul e tudo que senti por lá. Nessa semana começo a falar sobre minha segunda passagem por Jericoacoara, no Ceará.

4 de junho de 2023

Contextualizando Jeri

Dessa coluna em diante, meus textos já não terão mais grandes histórias e aventuras. Isso porque, por ora, elas simplesmente acabaram. Desde minha primeira edição por aqui (essa é a de número 47), meus relatos sempre eram baseados num passado mais distante. Um passado que ia apresentando toda minha grande epopeia que se iniciou em 2019 e cada vez mais se aproximava do momento presente. E estou cada vez mais próximo desse presente. E sabendo disso, já posso dizer que minhas grandes peripécias, pelo menos desse ciclo, já se finalizaram. Essa segunda passagem por Jericoacoara, quando pela primeira vez em 3 anos trabalhei oficialmente, considero o fechamento desse ciclo. O fechamento dessa jornada que durou mais de 3 anos. E um fechamento com chave de ouro, como se costuma falar. Me faltam palavras para descrever tudo que minha vivência de 3 meses em Jericoacoara representara para mim. O que me gerou, mudou e revelou. Ainda estou processando. Por isso, meus relatos daqui para a frente serão de cunho muito mais psicológico e emocional do que sobre histórias em si. Claro que tive e vou compartilhar bons acontecimentos que tive por Jeri, mas meu instinto de escritor, nesse exato momento, me permite muito mais compartilhar o que eu vivi e, principalmente, senti por lá. Felicidade. Uma felicidade absolutamente surreal. Uma felicidade que, com aquela intensidade, continuidade e genuinidade nunca tive nada nem perto em meus 32 anos de vida. Algumas das respostas para isso eu já tenho. Acredito que a maior parte. Algumas ainda vão aparecer com o tempo. Mas em Jeri, quando vivi o que vivi, decidi não pensar em nada. Apenas viver. Deixei de lado aquele costume que um viajante solitário de 3 anos de estrada sedento por autoconhecimento já tinha de buscar racionalizar os sentimentos. Apenas vivi. E a partir de agora começo a relatar um pouco disso. Pelo menos vou tentar.

Jericoacoara me abriu um portal sem precedentes sobre meu passado e sobre minha essência. Informações e sensações que até agora busco assimilar. Fez minha viagem ter um desfecho tão perfeito que me impulsionou para fazer algo que muitos sempre me diziam para fazer e que eu ainda não via fazer sentido: escrever um livro. Sempre achei que um livro tem que ter um desfecho, um sentido final. E eu, até Jeri, não havia chegado nesse sentido. Eu larguei uma vida convencional de absoluto sucesso e ganhos financeiros para me conhecer, entender quem era o Felipe e o que ele realmente queria para ser feliz. Isso, teoricamente, foi o que me guiou ao longo desses últimos 3 anos e que vocês acompanharam um pouco em minha coluna. E muito despretensiosamente, Jeri me deu essas respostas. Direta e indiretamente. São tantas informações e sentimentos que tive dificuldades (e ainda estou tendo) de como organizar tudo no papel, nessa escrita. Mas vou fazendo da forma que sair melhor. E aos poucos, ao longo das minhas seguintes edições, vou tentando debulhar e organizar esse grande desfecho que foi Jericoacoara.

Friso também que ao longo de minhas edições por aqui sempre busquei manter uma certa independência de texto para texto, para leitores não tão assíduos conseguirem ter uma experiência interessante. Tipo aquela série dos anos 90, Friends. Se pode ver qualquer episódio aleatório que o espectador vai dar risada, mesmo perdendo um pouco de uma linha cronológica que só quem viu todos os episódios anteriores sabe. Daqui para a frente vai ser algo mais perto da série Breaking Bad, quando não um dos episódios faz o próximo ficar meio sem sentido. Eu sei que isso afunila minha audiência, mas essa é a verdade. Essa é a minha verdade atual. Falar (ou pelo menos tentar) sobre um assunto que é um dos grandes mistérios dessa vida e que, conscientes ou inconscientes, estamos buscando o tempo todo: felicidade.

 

Amanhã pode acontecer tudo, inclusive…

FOTO – Um pouco do hostel em que Pipe trabalhou 

Minha volta do sul para o Ceará foi de avião. Os donos do hostel que eu iria gerenciar em Jericoacoara tinham pressa e precisavam de mim o quanto antes. A alta temporada de fim/início de ano se aproximava. Após passar a madrugada voando, desembarquei em Fortaleza junto com o nascimento do sol. Eu não havia dormido nada. Já não tenho muita facilidade em dormir sentado, o que piorou, quando descobri que meu acento do avião era o central. E com duas pessoas bem espaçosas do meu lado. Então, cheguei no Ceará muito cansado. Adail, um dos donos do hostel, me esperava no aeroporto para irmos para Jericoacoara. Estava ele e um amigo seu nos bancos da frente, o que me permitiu ser um pouco “mal educado” e deitar no banco de trás e tirar um bom cochilo durante as 5 horas que separam Fortaleza de Jeri. Chegamos lá no início da noite. 2 meses depois eu estava de volta. Tudo estava igual mas ao mesmo tempo diferente. Porque eu estava diferente. Saí de lá como um voluntário e voltei como gerente. A primeira vez que eu trabalharia oficialmente depois de 3 anos de sabatismo pelo Brasil. Friso que não fui para Jeri por causa de dinheiro. Fui apenas pela experiência. Mas claro, eu teria meu salário. Em nenhum momento, desde que eles haviam me feito o convite para gerenciar o hostel, criei expectativas sobre como seria essa experiência. Um belo hábito que adquiri na estrada. Não criar expectativas com nada. Claro que as vezes é meio incontrolável, mas isso foi uma das questões que julgo ter sido uma das que melhores trabalhei em minha jornada. Como diz meu forró preferido: “Amanhã pode acontecer tudo, inclusive nada”. Sensacional. Então, Jeri para mim seria apenas uma experiência. Que poderia me dizer muita coisa. Ou nada.

 

Meu canto

Adail e Neto, meus novos “chefes”, sempre tiveram um único hostel por Jeri, e que já estava próximo de fazer 7 anos. Como uma empreitada para crescer, arrendaram uma grande casa, que antes também funcionava como hostel, e abriram essa segunda operação por lá. Mas para eles era novidade. Um hostel a mais, 30 camas a mais para gerenciar. E ambos (são dois irmãos) costumavam fazer um tipo de revezamento presencial em Jeri de mais ou menos 15 dias. Enquanto um deles estava por lá, outro estava por Fortaleza, de onde eles são nativos, ou viajando por qualquer outro lugar. Um estilo de vida interessante. Permite não criar grandes estresses com o trabalho, no caso o hostel, e ao mesmo tempo, viajar. Mas isso funcionava bem com apenas um hostel. Com dois, daí o assunto mudava. E essa foi a justificativa de minha ida para lá. Por isso fui contratado para ser gerente dessa operação. Teoricamente, meu trabalho consistia em fazer check-ins e check-outs, captar e gerir os voluntários (viajantes que trocavam sua força de trabalho por estadia) e administrar problemas gerais que aparecessem. Desde o início, deixei combinado com eles que eu teria total autonomia sobretudo. Essa era uma condição minha para aceitar o trabalho. Eu já me conhecia no aspecto profissional e confiava muito no meu taco. E uma outra condição que impus foi de morar no novo hostel. Eu iria gerir ambos, mas teria que escolher onde seria minha morada. Em minha primeira passagem por Jeri fiquei fixado e como voluntário no hostel antigo, mas cheguei a conhecer o novo. E esse novo julguei ter muito mais a minha cara.

Uma ampla casa, com um igualmente amplo pátio e diversas árvores. Um contato mais próximo com a natureza, mesmo que no meu ambiente de trabalho. E um ponto dele que também me interessava muito era de ser mais afastado do centro da vila. Jeri é muito pequena, então quando se diz estar longe do centro significa estar a 5 minutos de distância a pé. Mas já fazia uma grande diferença na atmosfera do lugar. Uma atmosfera que vibrava mais em torno da paz. Por fim, um quarto apenas para mim. Também condicionei meu aceite para o cargo em ter um quarto privativo. Não só um quarto, uma suíte. Simples, mas uma suíte. Eu tinha meu próprio quarto e banheiro e sem estar de favor. Já fazia 3 anos que eu dormia sempre das formas mais sem privacidade possíveis pelo Brasil, e queria ter essa sensação de novo. Sensação que eu havia abandonada quando saí de Porto Alegre no final de 2019. Ter o meu canto. E escolhi inteligentemente um dos quartos privativos que o hostel possuía que ficava do lado de fora da casa maior. Para que eu não estivesse o tempo todo em meio aos hóspedes. E que também ficava ao lado da cozinha, o que me dava praticidade para cozinhar. E deu de imposições. Esse foi meu contexto por Jericoacoara, quando cheguei no dia 21 de dezembro de 2022. Contexto o qual eu estaria (quase perfeitamente) encaixado durante os 3 meses seguintes.

Na próxima semana, começo de fato os relatos de minhas vivências e sensações por Jericoacoara. Até lá!


Publicado em: Turismo






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