Em meio a pandemia, artistas buscam alternativas para retomada em Torres

Alguns atores de atividades no setor cultural falam ao jornal A FOLHA sobre os impactos de mais de um ano de restrições, por conta da crise sanitária, e dos projetos socioeconômicos possíveis para a classe artística

8 de junho de 2021

Após mais de um ano de uma espécie de ‘Estado de Exceção’ no Brasil por conta da pandemia de Covid 19, alguns setores da economia buscam voltar a ativa em meio a uma nova realizada, muitos após idas e vindas de fechamentos e aberturas de estabelecimentos, tudo também por conta das várias ondas de contaminação do Coronavírus ocorridas no  Brasil e em todo mundo. Mas o setor de eventos, principalmente o setor de artes e cultura ainda sofrem muitos impactos. Artistas, produtores de eventos, empreendedores de casas de apresentação de show, dentre outros tiveram que momentaneamente desistir de seus projetos pessoais ou empresariais, dar uma parada no trabalho, o que gerou reflexos de emprego, renda e movimentação de vários outros setores que são fornecedores secundários aos atores da cultura & eventos na pandemia.

O Governo Federal do Brasil promoveu algumas medidas de proteção a pequenos empreendedores e profissionais, que foram afetados por medidas de contenção ao coronavírus em várias fases da pandemia que ainda estamos passando. E os trabalhadores e empreendedores da Cultura foram alguns destes. Auxílios emergenciais foram dados a trabalhadores informais, empréstimos subsidiados, e pagamento de parte dos vencimentos de empreendedores que mantiveram seus trabalhadores (mesmo durante as medidas protetivas) amenizaram um pouco o baque financeiro que as pessoas que vivem de eventos e da arte tiveram e ainda estão tendo. Mas a situação está longe de ser tranquila para estes trabalhadores individuais, principalmente os que sobrevivem de vários (e muitas vezes pequenos) cachês.

 

 

Torrenses falam sobre impactos e projetos
FOTO: Ateliê de Roni Dalpiaz

 

A FOLHA consultou alguns atores do segmento da Cultura profissional em Torres para saber o diagnóstico destes perante os 14 meses de paradas/ modificações no trabalho do setor (até maio de 2021), assim como buscar nos depoimentos algumas ideias de propostas para que a sociedade pudesse ajudar artistas, promotores da arte e de eventos a voltarem a suas atividades de forma saudável, digna e sustentável.

O professor, pintor, ator e escritor torrense Roni Dalpiaz respondeu da seguinte forma:

 

A pergunta que me foi direcionada é relativa aos impactos da Pandemia sobre as artes e a cultura, e minha resposta é que, juntamente com o turismo, esta foi uma das atividades econômicas do país mais afetada. Foi a primeira a parar e certamente será a última a voltar.

A cultura no Brasil sempre foi “negligenciada”. Essa é a palavra mais amena que eu posso usar em relação ao Brasil, aos brasileiros do poder e aos brasileiros do dia a dia. Quando alguém pergunta sobre cultura no país eu penso em dificuldade e pouco apoio. Todos a acham importante, interessante, imprescindível, porém é logo esquecida e as ações e o dinheiro vão para algo mais urgente. Se sobrar, voltamos no assunto. E não foi diferente na Pandemia.

Com muita publicidade surgiu um alento aos “dependentes da cultura”, a Lei Aldir Blanc. Embora urgente e essencial, ela demorou muito tempo para ser efetivada e os recursos foram insuficientes para a demanda. Porém válidos.

Com base na amostragem da cidade, o público envolvido em qualquer tipo de atividade relacionada à cultura não foi abrangido em sua totalidade. Muita gente ficou de fora. Por simples desconhecimento da lei ou por alguma dificuldade advinda da forma de cadastro. Os valores recebidos, de acordo com o site da prefeitura, do estado e do país, parecem vultosos, mas se diluídos entre os diretamente envolvidos e aqueles indiretamente, se transformam em quase nada. E menos ainda se dividido pelo número de meses sem atividades.

Alguns artistas migraram rapidamente para os meios virtuais tentando manterem-se na ativa. Os que não puderam ou não tinham recursos para isso, foram forçados a buscar empregos alternativos a fim de sobreviverem (literalmente). Falo isso de todo o tipo de artistas, ativistas culturais, promotores de eventos, casas de eventos, museus e ainda outros envolvidos direta e indiretamente com a cultura. Todos sofreram, com perda total ou parcial da renda. O impacto foi devastador.

A Cultura no país e seus agentes foi fortemente impactada e certamente serão necessárias políticas públicas de incentivo e/ou fomento para o ressurgimento das várias atividades individuais e coletivas que não sobreviveram a mais de ano sem funcionamento. Vai ser uma longa caminhada”.

 

Sinalização de um espaço para apresentações seria importante

Tomazzo Mottironi, morador de Torres, é professor, editor e Promotor Cultural, além de idealizador e Gestor do projeto Cineclube de Torres e outras atividades no meio.  Sobre a Cultura em meio a Pandemia na cidade, ele indicou o seguinte:

 

Sem dúvida, na pandemia o setor que mais sofreu foi o setor cultural: foi dos primeiros a interromper as atividades, muitas vezes antes dos primeiros decretos como no caso do Cineclube Torres, e está praticamente paralisado até hoje. Há exceções no segmento da música, onde teve uma pequena retomada, mas resumida à presença de músicos em espaços comerciais, como restaurantes e bares, no final do ano de 2020 e nos primeiros meses desse ano, sendo interrompido novamente com a piora sanitária, apelidada de 2ª onda.

Também no artesanato, houve uma tímida retoma, a partir de novembro. E de momento é um dos segmentos que pode operar, condicionado por protocolos sanitários rígidos. Os demais setores, especialmente os que dependem de apresentação ao público, audiovisual, dança, teatro e também parcialmente música, estão paralisados, operando exclusivamente pelos canais virtuais.

O Cineclube Torres, teve sua última exibição pública em março 2020, uma sessão no Mova (hoje fechado), que deveria integrar um ciclo cancelado pela pandemia, e desde então só realizou pontualmente algumas sessões online, temáticas, no dia da Consciência Negra e para o festival CineSerra, de quem é parceiro exibidor.

Um alento ao setor cultural foi sem dúvida a Lei Aldir Blanc, que trouxe para o município a possibilidade de distribuir quase 300 mil reais de auxílios, subdivididos em subsídios para Pessoas Jurídicas e Pessoas Físicas, mediante contrapartidas a realizar em 2021.

Esta aplicação financeira de recursos federais só foi possível pela mobilização da classe artístico-cultural da cidade e pelo empenho da prefeitura que operou esta transferência (através de editais públicos de subsídio, fomento e trajetória), embora finalizada com certo atraso, só efetivando repasses no final do ano, e evidenciando algum problema de transparência, por exemplo, a ausência da publicação das pessoas jurídicas contempladas.

Passado mais de um ano da eclosão da crise sanitária, mesmo nesse cenário de retomada geral de atividades, embora com números ainda poucos animadores, as perspectivas para o setor artístico não são boas. É difícil prever um calendário para programar eventos presenciais sejam eles de pequeno, médio ou grande porte, de qualquer segmento artístico, audiovisual, teatro, dança ou música.

Em Torres isso é ainda mais crítico pela ausência de um espaço público para eventos, após a entrega à SAPT do Auditório, só restou o salão do Museu, que atualmente está entrando em obras, mas sem que tenha sido divulgado o projeto, seus objetivos, e informar quais espaços estarão à disposição após esta reforma e com quais caraterísticas.

Seria oportuno nesse momento aproveitar esta dinâmica do grupo de artistas e produtores que se mobilizaram para Lei Aldir Blanc – e também este perdurar da interrupção de atividades para o público – para articular um diálogo mais eficaz com o poder público.

Esse diálogo retomaria o processo de democratização dos mecanismos de gestão e fomento previstos pela Lei Quadro Municipal do setor, abrangendo assim perspectivas para os equipamentos culturais públicos, o fomento pelo Fundo Municipal de Cultura e a elaboração de inventário para a consolidação de um Plano de Cultura municipal”.

 

Contratações e oferecimento de programas online
FOTO: Um dos projetos culturais apoiados pelo Sesc Torres em meio a pandemia

 

Rodrigo Danni é diretor da regional do Serviço Social do Comércio (Sesc RS) da região da Grande Torres, além de gerenciar o Hotel do Sesc na cidade. A entidade tradicionalmente promove a cultura de forma total ou semi  subsidiada para  o público, contratando artistas ou eventos culturais para que façam parte dos projetos implementados nas cidades onde atua. E Torres é uma delas. E o dirigente do SESC respondeu a indagação de A FOLHA sobre a mesma questão com o seguinte texto:

 

“A pandemia de Covid trouxe impactos altíssimos nas atividades como um todo, em especial nas de Cultura. A impossibilidade de qualquer atividade presencial e o fechamento de Bares, Hotéis, Restaurantes bem como a restrição de atividades em locais públicos, levou para uma total recessão aos artistas.

Dentro do possível e respeitando todos os protocolos de distanciamento, em 2020 realizamos mais 20 ações culturais priorizando as atividades online e valorizando sempre os artistas locais de nossa região, com isso conseguimos de alguma forma auxiliar a cultura local dentro das possibilidades.

Em 2021 já realizamos ações de música e artes visuais dentro do nosso programa arte Sesc Cultura por Toda a Parte. Com a gradual abertura e o avanço da vacinação, acreditamos que neste segundo semestre poderemos auxiliar ainda mais a cultura local com novas atividades.

Este é um período complexo que evidencia ainda mais a importância dos investimentos da Fecomércio Sesc/Senac em nossa região.

Seguiremos com nossa missão de promover ações para o bem estar social dos trabalhadores do comércio de bens, serviços e turismo bem como da sociedade como um todo, nas áreas de saúde, educação, cultura, esporte e lazer”.

 

Prefeitura de Torres trabalha “para a frente”

 

A FOLHA consultou a área de cultura da Prefeitura Municipal de Torres sobre a mesma questão – os desafios da Cultura em meio a pandemia. Foi feita uma reunião com a Diretoria de Cultura, Maria do Carmo Confort e com o novo secretário da pasta recém empossado então, José Mauri Rodrigues.

A resposta dos dirigentes relacionados a cultura na prefeitura de Torres foi com um olhar para o futuro, para programas e projetos que estão sendo ainda idealizados. Lembrando que atualmente houve uma quase reativação da pasta (que estava dentro de outra secretaria anteriormente) A resposta da municipalidade veio com o seguinte texto:

 

“Estamos estruturando a secretaria municipal da Cultura e do Esporte e assim organizando a criação dos Planos Municipais de Cultura e do Esporte (claro que através de calendário de reuniões com a comunidade). Também estamos formando os conselhos e seus respectivos fundos. Posteriormente organizado, estaremos executando os planos conforme as necessidades dos setores”.


Publicado em: Cultura






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