Proibição da pesca de arrasto entra em debate aqui em Torres

Colônia de Pescadores se assessora de estudos técnicos para proteger a pesca artesanal na região e quer criar comissão especial na Câmara de Vereadores

Pesca de Arrasto (Imagem meramente ilustrativa. FONTE: Justiça Federal)
12 de agosto de 2019

Na última semana entrou em debate aqui no Rio Grande do Sul a questão da legislação estadual específica que regulamenta a chamada “Pesca de Arrasto” – uma forma de pescaria onde redes levam quase tudo pela frente – técnica muito usada no Brasil, principalmente em Santa Catarina. É que uma lei aprovada no ano de 2018 no estado do Rio Grande do Sul proíbe a pesca de arrasto de fundo a uma distância inferior a 12 milhas náuticas da costa (22,2 km). Mas em nível federal,  o Governo de Jair Bolsonaro questiona a eficácia desta lei para o que ela se propõe. E consequentemente quer que a mesma Assembleia Legislativa estadual – junto com o governo Eduardo Leite – revogue a lei.

Um estudo da Fundação da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) mostra a importância da proibição da captura de espécies dentro das 12 milhas. A conclusão é de que a medida ampliará a oferta de pescado na costa gaúcha a partir do segundo ano de vigência da lei, que teria consequências neste ano, pois a lei foi aprovada no final do ano passado, ainda no governo Sartori.

Já o representante do Governo Federal possui outros estudos internacionais – os quais colocam em cheque o estudo gaúcho. Secretário Nacional de Aquicultura e Pesca, Jorge Seif lembra que a proibição deste tipo de pesca (como está feito no RS) vai gerar a inviabilização de muitos pescadores brasileiros que pescam na costa do RS nesta época do ano (2º semestre), local onde aparecem os cardumes de peixes obtidos pela pesca de arrasto.  Seif ainda questiona as condições da aprovação da lei que proíbe a pesca de arrasto no RS, segundo ele embasada em um estudo não publicado de uma ONG. O governo Federal argumenta que o oceano não é de gestão estadual e sim federal. E sugere que irá judicializar a questão caso a lei do RS não seja revogada.

Em Torres, proposta é a criação de Comissão da Câmara Municipal 

Na mesma segunda-feira, dia 5 de agosto, participou da Tribuna Popular da sessão da Câmara de Vereadores de Torres, o presidente da Colônia de Pescadores da cidade, Osvaldo da Silveira. Ele levou junto uma assessoria da colônia, feita pelo Professor e Doutor Walter Nisa Castro Neto, CEO da Pró-Squalus e Coordenador Geral do Projeto Carcharias. Eles foram apresentar aos vereadores a ideia da criação, dentro do Poder Legislativo, de uma comissão especial da Pesca.

O trabalho seria feito para tratar – na ponta e com as autoridades regionais e municipais – legislações e lutas que ajudem no desenvolvimento e na proteção da Pesca e do ambiente pesqueiro (oceano) em Torres e nas cidades vizinhas. E um dos trabalhos a serem tocados no projeto, por exemplo, seria justamente o de buscar manter a proibição da Pesca de Arrasto no litoral gaúcho – a partir do Rio Mampituba – como manda a lei estadual aprovada em 2018 (a mesma que o governo federal quer que seja revogada).

Foram apresentadas outras ideias que um trabalho de comissão especial de pesca na Câmara torrense poderia proporcionar para a sociedade – que historicamente tem pescadores artesanais em sua estrutura social e produtiva. Além disto, manteria e produziria legislação para atacar as duas mazelas da pesca de arrasto: a destruição do solo do fundo do mar pelas redes (e seu ecossistema) e a diminuição da oferta de determinadas espécies de peixes aos pescadores artesanais (causadas pela pesca de arrasto, que captura imensos cardumes em nossa costa deixando pouco para os pescadores artesanais locais).

Mas a comissão busca fomentar a utilização de pesquisas científicas sobre o ambiente marinho no sentido de proteger o ambiente e fomentar a profissão de pescadores artesanais no sul baseado em dados técnicos, evitando decisões políticas que possam prejudicar o sistema.  Abaixo, um artigo escrito pelo professor Walter sobre o assunto.

 

Justifica-se a permanência da Lei 15.223 de 2018, que regulamenta/ordena a pesca de arrasto além das 12 milhas náuticas no litoral do Rio Grande do Sul. Esta regulamentação detém dois significativos aspectos para a sua permanência, relacionados ao aspecto Natural, conservação da Biodiversidade e o aspecto econômico-social, conservação do patrimônio das Comunidades, evasão de divisas, manutenção estratégica dos recursos e supressão de risco social.

                Inicialmente, trata-se da conservação e preservação da rica biodiversidade componente do litoral gaúcho. O “Mar do Estado do Rio Grande do Sul”, ou seja, o litoral e a costa, estão geograficamente inseridos na porção subtropical da América do Sul. Esta posição detém características abióticas singulares, que por sua vez, proporcionam fatores bióticos únicos nos Oceanos e Mares do Mundo. O Litoral do Rio Grande do Sul não está inserido somente neste trecho, pois o mesmo se inter-relaciona com toda a costa, proporcionado e assegurando toda a cadeia trófica na costa, no continente e em águas mais profundas. Nesta área de 12 milhas náuticas, a maioria das espécies de invertebrados, elasmobrânquios, peixes, tartarugas marinhas, aves e mamíferos marinhos se alimentam, reproduzem e criam suas proles nos primeiros estágios de vida. Há um significativo incremento nesta área na biomassa de peixes durante os meses de primavera e verão em função dos processos reprodutivos, como por exemplo, os camarões, as tainhas e scianídeos (corvinas, papa-terras, batatas) que podem emigrar da Laguna dos Patos para o mar, após período de crescimento em águas continentais e, após partirem em processos migratórios para águas mais ao norte e quentes. Agrega-se a este processo, a convergência de outras espécies que estão alinhadas a este ciclo, e, participam deste processo, a fim de se alimentar, reproduzir e proporcionar alimentação para seus filhotes. Por si só, este contexto serviria para a permanência desta Lei, pois é importante para a manutenção de toda a biodiversidade, regulação e manutenção das características fisionômicas da costa gaúcha.

                Entretanto, o segundo aspecto, converge a esse de maneira complementar e, de igual força, vital para a hegemonia estratégica do Estado do Rio Grande do Sul, assim como do resguardo de suas riquezas, recursos e supressão de risco econômico-social. As comunidades instaladas na costa do Estado, desenvolveram ao longo de suas Histórias, uma relação íntima com a pesca e, consequentemente, dependência desta atividade. Historicamente, grandes cidades se formaram, se fixaram e se desenvolveram em função do recurso pesqueiro. E, posteriormente, este recurso atraiu interesses de outros Estados da Federação, como Santa Catarina, Paraná, São Paulo e outros mais ao norte, assim como de outros países, como Japão, China e Coréia, somente para citar exemplo de onde se direcionam as frotas pesqueiras para praticarem a pesca no litoral do Rio Grande do Sul. Neste aspecto, está inserido a “rede” de interrelações danosas ao Estado.

                Em função do primeiro aspecto, localização geográfica que proporciona rica biodiversidade, a maior extensão de área para a prática da atividade pesqueira no Brasil, e, consequentemente, a detenção da maior área piscosa do Brasil. Em função do segundo aspecto, patrimônio Natural e Social do Estado do Rio Grande do Sul. A desarticulação da Lei, proporcionaria ao Estado uma grande perda de recursos naturais, recursos econômicos e recursos estratégicos de crescimento. Estes, atualmente, já sofrem perdas em função da pesca predatória e ilegal ao longo da costa gaúcha. Consequentemente, acarretaria o aumento do risco social, em função da desarticulação das comunidades de pescadores (Industriais e Artesanais) que possui o Estado. Por sua vez, ocorreria a geração de desemprego, aumento do risco social, principalmente para as crianças, pois com a diminuição da renda familiar, aumentaria o risco do abandono às Escolas. Aumento da ingerência do Estado em alocar recursos de outras áreas para a manutenção destas comunidades, e, diminuição consequente, nas estratégias de melhora na qualidade de vida destas comunidades. Aumento na vulnerabilidade à saúde, em virtude da diminuição dos recursos disponíveis para alimentação e manutenção da qualidade de vida destes cidadãos.

                Analisando estes dois aspectos, somados, de maneira inicial, observa e requer-se a permanência da Lei 15.223.

 

Prof. Dr. Walter NISA-CASTRO-NETO

CEO da Pró-Squalus

Coordenador Geral do Projeto Carcharias








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