Sobre reintegração de posse que fez família torrense sair do local onde vivia há mais de 30 anos

Ação, que culminou com a derrubada de residências e de um pequeno atelier, ocorreu na última terça-feira (04) após desacordo (de anos) entre proprietário do terreno e ocupantes

Momento em que uma das residências estava sendo demolida
9 de dezembro de 2017

Uma família de moradores de Torres teve de sair da residência onde moravam há décadas nesta terça-feira (05). Tratou-se de uma ação de reintegração de posse, realizada com presença de oficiais de justiça e do Pelotão de Operações Especiais (POE) da Brigada Militar, no terreno onde  haviam 3 casas (além de um pequeno atelier), às margens da BR-101 na Vila São João.

O dono da propriedade – que requereu a reintegração de posse –  é o empresário Claudio Dorneles Marinho, morador de Torres. Já a outra parte no processo é a artesã Geminia Nazareth Martins (mais conhecida por Naza) que há mais de 30 anos vivia no local com seu esposo Luís Carlos da Silva. No mesmo terreno, mas em outra casa, vivia também o filho do casal, Lucas da Silva, com sua mulher e dois filhos. Mas já na quarta-fera (06), não havia mais nenhuma edificação no local, tudo posto abaxo .

 

Família teve que deixar o local e casas foram demolidas

 

O jornal A FOLHA esteve no local para averiguar de perto a situação. Haviam no total 4 casas – sendo duas destas habitadas, e uma outra que servia de atelier para a artesã Naza. Ao chegarmos lá, por volta das 15h de terça-feira (05), uma residência (que não vinha sendo ocupada) já havia sido demolida por máquinas, e outra (onde viviam Naza e Luís Carlos) estava em processo de desmontagem/demolição. Quatro cachorrinhos, filhotes que estavam sendo criados pelo casal, passavam de um lado para o outro, abanando o rabo em meio a uma situação que não entendiam.  Observando a cena durante o dia inteiro, o pintor e autônomo Luís Carlos  da Silva – que por 31 anos morou no terreno – lamentava a situação, e o fato de não ter para onde ir. “Por enquanto vamos ter que ir para a casa do meu genro, que mora em Torres. Os cachorrinhos vão junto. Mas não é a situação que queríamos, passei boa parte da minha vida aqui, criei meus filhos aqui” ressaltou Luís Carlos, enquanto sua casa ia rapidamente sendo derrubada.

Subindo para a parte mais alta do terreno, chegamos ao ponto onde estava Lucas da Silva, filho de Naza e Luís Carlos, em frente a sua casa. No memento em que chegamos, lá também estavam dois oficiais de justiça designados para acompanhar a ação de reintegração de posse. Resignado e triste, Lucas desenterrava a árvore que havia ganho cerca de 4 anos atrás, entregue a ele pelo Hospital de Torres (e ONG Onda Verde) em decorrência do nascimento de sua filha. “Essa árvore é importante pra mim, não vou deixar uma máquina passar por cima dela”, disse um emocionado Lucas, em meio às lagrimas. A residência de madeira – onde ele vivia com a companheira, a filha e a enteada –  ainda estava em pé, mas só até ele pegar suas coisas e desocupar o lugar. Conforme Lucas, no horário do almoço funcionários pilotando um trator teriam chegado já para demolir a casa, mas ele conseguiu evitar que botassem a casa abaixo antes dele recolher seus pertences.  “Vivi nessa casa por 10 anos, é uma dor ter que sair. Não tenho para onde ir definitivamente, por enquanto vamos ficar na casa da minha sogra. Mas ela já mora de favor com uma filha, então o lugar já está cheio. Vamos ter que ficar lá mas só provisoriamente”.

Em conversa com um dos oficiais de justiça que acompanhavam a ação, fomos informados de que já faz anos que está tramitando no Foro de Torres o processo relativo ao terreno em questão – enorme área, com cerca de 7 hectares (70 mil metros quadrados) junto a BR-101. “O fato foi que as partes não entraram em acordo. Houveram reuniões entre o dono de terreno e a família que estava ocupando a área, mas como não se chegou a um consenso o proprietário requereu a necessidade do cumprimento deste mandato judicial”, indicou o oficial de justiça do Foro de Torres, que salientou que a o aceite judicial para a ação partiu do juiz André Dorneles .

 

Policiais do POE acompanharam a ação

 

Desacordo entre as partes

 

Segundo havia anteriormente afirmado a artesã Naza(em email enviado ao jornal A FOLHA), existe um acordo verbal combinado entre ela o proprietário, de moradia no terreno desde o ano de 86 – pela qual  eles poderiam viver no local em troca de trabalho e cuidado da propriedade. Na época da duplicação da BR-101, um acordo teria sido feito entre proprietário e ocupantes do terreno, sendo que seria cedido a estes uma parte da propriedade e um valor (R$ 20 mil) para construção de uma casa. Mas Naza diz que “foi enrolada” pelo proprietário, que não teria cumprido o prometido, desvalorizando ainda algumas benfeitorias que a família teriam trazido ao terreno desde sua ocupação. A artesã afirmou que vai resistir e que considera injusto o proprietário despejá-la de sua residência depois de tantos anos. Naza e Luís Carlos, afirmam, ainda, que há um processo de usocapião correndo, que poderá lhes garantir o direito a posse do terreno. Além disso, reivindicam salários integrais pelos 31 anos de serviço.

Versão bem diferente foi apresentada pelo proprietário do terreno. Contatado pelo Jornal A FOLHA, Cláudio Dorneles Marinho ressalta que o acordo firmado era com a família era de comodato (ou seja, um empréstimo apenas para moradia temporária), e que por diversas vezes, seu advogado tentou acordo com a família nos últimos anos. “Ela alegava que a área era dela, e que eu não tinha nada a ver com isso, e que ela só sairia por conta da justiça. Ela tinha convicção de que era a dona”. Marinho diz que chegou a oferecer para Naza e sua família cerca de 1200m do terreno, bem como a manutenção das residências e do atelier. “Mas eles não aceitaram essa proposta, queriam mais, e diziam que só sairiam por força da justiça. Por isso tivemos que partir para as medidas cabíveis”, indica o proprietário do terreno, que destaca ainda que as residências (agora derrubadas) estavam irregulares e embargadas pela prefeitura. Estou muito tranquilo, pois comprei o terreno no começo dos anos 70, tenho escritura e toda a documentação, sempre fui apenas eu quem paguei os impostos. Ela foi avisada várias vezes de que o processo de reintegração ocorreria’, concluiu Marinho.


Publicado em: Geral






Veja Também





Links Patrocinados