Dom Pedro I, afinal, pernoitou ou não pernoitou em Torres?

A história é algo vivo mesmo. Em um momento se tem certeza de uma coisa, em outro se levanta uma dúvida e em um terceiro momento se conclui outra coisa. Em Torres, temos uma história sobre o nosso primeiro imperador, Dom Pedro I, sendo que dizem que ele passou por aqui - mas será que o imperador pernoitou em Torres?

19 de junho de 2022

A história é algo vivo mesmo. Em um momento se tem certeza de uma coisa, em outro se levanta uma dúvida e em um terceiro momento se conclui outra coisa. Uma história contada e repassada nas escolas ninguém nem ousava discutir. Mais tarde, muitas dessas histórias foram recontadas com muitas versões. Hoje nem sei como elas são apresentadas para nossas crianças. Só sei que duvido da veracidade de muitas delas.

Também não é para menos, é só dar uma pesquisada sobre qualquer assunto que descobrimos algo novo ou que jogue dúvida sobre qualquer história que se conheça. Temos, em Torres, uma história que nos orgulhamos e a recontamos durante anos a fio. A história é sobre o nosso primeiro imperador, Dom Pedro I, dizem que ele passou por aqui. Sim, aqui em Torres, e de acordo com o historiador Ruschel, ele havia pernoitado na casa do Alferes durante sua viagem até a Cisplatina (Uruguai) onde o império brasileiro travava uma luta para a manutenção da colônia.

“O rio Mampituba foi atingido e atravessado no dia 5 de dezembro (de 1826), numa terça-feira. (…) O ponto alto da recepção foi a salva de 101 tiros de canhão do baluarte Ipiranga, como saudação à imperial personagem que se aproximava da igreja de São Domingos, recém inaugurada. (…) Consta que pernoitou na casa nº 1 da cidade, ainda existente. Tratava-se de prédio que integrava o complexo administrativo-militar da época, situado entre a igreja e o baluarte e de onde o primeiro chefe de estado do Brasil Independente pôde apreciar a paisagem: a lagoa, as florestas e a ilha dos lobos. Na manhã seguinte continuou viagem, levando menos de 3 dias para chegar em Porto Alegre.”

O fato é que há alguns anos, um escritor, o meu amigo Nelson Adams Filho, levantou uma tese dizendo que Dom Pedro I, passou por aqui sim, em 1826, porém não pernoitou. Pois segundo uma carta que D. Pedro I escreveu à Imperatriz Leopoldina em 8 de dezembro, ele havia pernoitado um pouco mais adiante, na Estância do Pacheco.

“Em seu itinerário ele (D. Pedro I) relata que na noite de 4 para 5 de dezembro dormiu numa barraca de sapê abandonada junto ao Arroio Grande que situava na Sesmaria dos Rodrigues, a cerca de 17 ou 18 quilômetros da foz do Mampituba em área que se tornaria o município de Passo de Torres. (…) Às 5 horas e ¾ do dia 5 de dezembro, uma terça-feira, D. Pedro I montou a cavalo, deixou a barraca de sapê e saiu do mato em direção à praia, onde chegou 15 minutos depois. (…) Meia hora depois a comitiva chegou às margens do Mampituba. Ocorreu a travessia e às 8 horas D. Pedro e Comitiva chegaram a Torres, provavelmente ao Baluarte Ipiranga. (…) Ali a primeira ação foi lavar-se. A seguir tomou café da manhã (no itinerário ele chama de janta, mas pelo horário era o café-da-manhã). O relato seguinte é que às 2 horas e ¼ ele montou a cavalo e às 7 horas e 1/1 chegou à Estância do Pacheco, ‘e ali dormimos’ (expressão dele no itinerário).”

As duas versões estão postas, cada uma tem sua fonte e sua forma de contar a história. Porém, como o  próprio Nelson diz, a história está sempre sendo reescrita.

A discussão se pernoitou ou não pernoitou é até engraçada. Ora, se ele passou por aqui e existia, pelo que se sabe, só a casa do Alferes (a Casa Número 1) como moradia, ele deve ter, pelo menos, tirado uma soneca na cama do Manoel Ferreira Porto.

Brincadeiras à parte, em uma conversa com um colega, lembrei desta história quando ele abordou o assunto do sono. Vou explicar. Ele me perguntou se eu sabia da história de que antigamente as pessoas dormiam duas vezes durante a noite. Quando ele disse isso eu me lembrei de um antigo filme onde essa prática acontecia. As pessoas dormiam no começo da noite, acordavam em um horário entre meia noite e duas da manhã, faziam algumas tarefas e depois iam dormir novamente.

Este costume, que não me lembrava, despertou a curiosidade de ler novamente sobre o tal “pernoite” do Imperador. Eu já havia pensado sobre isso quando da controvérsia, e tinha algo que me intrigava, como alguém tão meticuloso como o Ruschel iria se enganar neste detalhe das horas? Será que foi um erro ou será que ele conhecia mais detalhes que não estavam tão explícitos para nós?

Na semana que vem eu continuo esta história…

 

Fontes: Ruy R. Ruschel, Nelson A. Filho, Arquivo Biblioteca Rio-grandense.

 

 

 




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