EIRA, BEIRA E TRIBEIRA: Verdades ou mentiras em Torres?

A expressão conhecida é “sem eira nem beira”, que diante dos casarios açorianos do Brasil inteiro, foi estendida para as abas externas desses casarios se transformando na conhecida história dos beirais das casas.

4 de fevereiro de 2024

Meu Deus, será que tudo que escutei de história na minha vida era mentira (fake)? Os índios não são mais índios ou indígenas, são povos primitivos (tudo por causa do caminho errado para chegar à Índia, mas eles já sabiam disso há muito tempo). Antigamente chamados de escravos, hoje (com justiça) a denominação mudou para escravizados. O D. Pedro I e o grito de independência às margens plácidas do Ipiranga não aconteceu, primeiro porque dizem que as margens não tinham nada de plácidas, tampouco D. Pedro I gritou, talvez tenha falado um pouco alto para uma multidão de menos de 10 pessoas. E assim vai pelo ralo anos de estudos na disciplina de História do Brasil e, certamente, da história mundial.

Por  Torres, muitas histórias locais como a cochilada de D. Pedro I na casa do alferes, foram contestadas (mas que ele passou por aqui, passou). Lendas, que alguns historiadores juram de “pés juntos” serem verdadeiras, podem ter algumas “licenças poéticas”. Na verdade, lendas como a história do sequilho, dos gnomos, da noiva da guarita, do tesouro da furna do Diamante, fazem parte da contação de histórias relacionadas, e ludicamente inseridas, nas atividades turísticas da cidade.

Esses dias, conversando por WhatsApp com o amigo e historiador Leo Gedeon a respeito de uma postagem que desmentia a repetida história da “Eira, beira e tribeira” de influência açoriana, fui “provocado” (no bom sentido) a escrever sobre o tema.

A expressão conhecida é “sem eira nem beira”, que diante dos casarios açorianos do Brasil inteiro, foi estendida para as abas externas desses casarios se transformando na conhecida história dos beirais das casas. Sem eira nem beira, morador pobre; com eira, morador com posses; com eira e beira, morador rico, muito rico; com eira, beira e tribeira, muito rico e com posição política na cidade.

“Essa expressão é bem antiga e tem origem em Portugal, da Idade Média. Ao contrário do que costumamos ouvir, ver vídeos e ler em artigos afirmando que essa expressão “nem eira e nem beira”, e tem gente que acrescenta até “tribeira”, era a forma de divisão social entre pobres e ricos. Na expressão original, Medieval, nunca foi esse o significado de “nem eira e nem beira”. Aliás, essa expressão de divisão social entre pobres e ricos se limitar a simples adornos em telhados é invenção brasileira, difundida por Guias de Turismo pelo Brasil afora.” 

Assim como há beiras (desculpe o trocadilho) de verdades em todas as histórias contadas e recontadas por aí, há também inverdades (deliberadas ou não), porém repetidas tantas vezes que passam a ser verdades não contestadas. Esta da “Eira, beira e tribeira” certamente é uma delas.

Para tentar explicar essa “meia verdade” da expressão “Eira, beira e tribeira” temos que separar a expressão em partes. Eira é um terreno ou local cuja superfície não possui saliências, normalmente feito sobre terra batida, utilizado para debulhar, secar, trilhar e limpar legumes e cereais. Na Etimologia (origem da palavra eira) ela deriva do latim area. Beira, seria a proteção dessa área, um beirado que evita se perder o que se armazena. Na arquitetura, beira é um ornamento de pequena profundidade na alvenaria no ponto de ligação com o telhado. E a tribeira? Realmente não há nada a respeito dessa palavra a não ser a rima, que segundo Pimenta (ver referências), os falantes da língua portuguesa adoram rimas nas expressões idiomáticas, como: De cabo a rabo, não misturam alhos com bugalhos, mesmo aos trancos e barrancos, meio lá meio cá; fazem de gato e sapato, quem vive aos trapos e farrapos; movendo mundos e fundos, quem não junta lé com cré, não tuge nem muge; verdade nua e crua.

Meia verdade. Apenas faltou a tribeira! Pessoas abastadas, colocavam eira, quem era pobre não adornava sua casa, ou seja, não tinham eira e nem beira. A tribeira veio rimando com eira e beira, alguém deve ter pensado em algo mais e colocou a política neste meio. Pronto, estava montada a história, com meias verdades, porém todas coerentes. Reiterada ao longo dos anos, virou verdade até para quem construía sua casa em tempos idos. Virou verdade.

Aqui em Torres eu uso a expressão “Eira, beira e tribeira” como entretenimento, de forma lúdica ela é inserida na história local e serve para ilustrar ainda mais o que se vê ao vivo nas ruas do antigo centro histórico da cidade. Não acredito que, assim como a história da passagem de D. Pedro I pela cidade e a ideia de que pernoitou ou não na casa do Alferes ou no Fortim, seja uma mentira, digamos que a informação apenas não pode ser comprovada, pois faz parte do imaginário popular.

 

Referências: ‘A casa da mãe Joana: curiosidades nas origens das palavras, frases e marcas’, de Reinaldo Pimenta, 2002. https://www.vivadecora.com.br/pro/eira-beira-e-tribeira/; https://www.conhecaminas.com/2019/12/a-eira-beira-e-tribeira.html; https://blog.archtrends.com/arquitetura-acoriana/




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