Imaginando as Férias em Torres (de muitos séculos atrás!)

Ao olhar fotos antigas eu sempre tento imaginar como seria todo o resto que não estava contido naquele pedaço de papel. E da mesma forma, lendo alguma descrição histórica, imagino como deveria ser aquele local tão ricamente exposto.... vamos imaginar Torres do passado

história de torresDesenho de Herrmann Rudolf Wendroth: A praia da Guarita, 1852. (FOTO: Wikipédia Commons)
16 de maio de 2022

Tão ou mais difícil como projetar o futuro, é descrever o passado. Claro que alguns fatos, locais ou acontecimentos passados já foram descritos com detalhes impressionantes, porém outros faltam fontes, documentos, datas… Ao olhar fotos antigas eu sempre tento imaginar como seria todo o resto que não estava contido naquele pedaço de papel. E da mesma forma, lendo alguma descrição histórica, imagino como deveria ser aquele local tão ricamente exposto.

Imaginemos Torres no passado… Viajantes vindos pela estrada de Laguna, atravessando as correntezas do Mampituba em direção as três grandes torres que adentram o mar… Imaginar, completar, materializar nem que seja numa pintura ou desenho, o que foi descrito ao longo dos anos sobre a vila de Torres, e assim observar e admirar.  Talvez as primeiras descrições lembrem aquelas praias desertas que muita gente adoraria passar suas férias ou o resto de suas vidas. Essa poderia ser a Torres de 1500, algo bem próximo da descrição de um paraíso aqui na terra.

Em uma crônica do historiador Ruy Ruben Ruschel, há uma descrição de como poderia ter sido nossa cidade na época do descobrimento do Brasil. Ruschel tenta visualizar a região a partir de três fatores básicos: as areias, o lençol freático e as matas. Iniciando pelas areias ele descreve que a faixa plana de praia só existia até onde a maré chegava, o que concentravam ali mesmo as grandes dunas, deixando a Praia Grande, Praia da Cal e Praia da Itapeva bem mais estreitas do que hoje. “Logo atrás dessa linha estreita, mole e ondulada de praia é que se concentravam, em grandes dunas, quase todas as areias Torrenses. Formavam dunas enormes, até 20 m ou mais de altura, alinhadas em poucos bastidores, ocupariam os espaços agora do calçadão da beira-mar e das primeiras quadras na praia grande e da Cal.”

Já o lençol freático, há cinco séculos, ficava bem acima do presente, estendendo pelas planícies  torrenses que viviam encharcadas. Os pantanais iam desde às margens do Mampituba até a encosta da Itapeva, e também daí para o sul. “Paralelos ao mar, esses banhados começavam logo atrás das grandes dunas e às vezes tinham 1km ou mais de largu ra. O primeiro deles vinha desde a atual ponte pênsil até a extremidade norte da Lagoa do Violão (Ronda) com desenvolvimento ao longo das margens do Mampituba (Potreiro).” Pelo descrito, as terras da atual cidade e de seu entorno eram encharcadas e cobertas de tiriricas, povoada de jacarés, lagartos, cobras, capivaras, pacas, garças, marrecas migratórias e tantos outros animais de pântano.

O terceiro grande fator da paisagem torrense de outrora, segundo Ruschel, foi a presença dominante da Mata Atlântica. “Nas Torres, a floresta encontrava condições de desenvolvimento até onde, abrigada dos Ventos marítimos (vento Nordeste predominante e o Vento Sul), grandes capões havia na hoje Cidade Alta, nas encostas do Morro do Farol, nas Fur nas da guarita e na torre do Sul, bem como na Itapeva. Até mesmo entre a Falésia do Morro do farol e o mar se tinha desenvolvido uma réstia de mato abrigada pelas enormes rochas que ali existiam.”

Este era, mais ou menos, o cenário por volta de 1500 e que deve ter permanecido assim até por volta de 1800, quando, finalmente, começaram a acontecer alguns fatos relevantes nesta região.

 

A partir do final de século XVIII

 

A região de Torres, em 1777, começou a deixar calmaria de lado e o paraíso foi alterado, Jacob (Jaques ou Diogo) Funck, ergueu no alto da torre norte o primeiro fortim em defesa do continente de Rio Grande de São Pedro. O Fortim São Diogo das Torres foi construído na subida do Morro do Farol, próximo ao prédio da escola abandonada. Composto por duas amuradas de terra em ângulo, com 300m de comprimento, e dois canhões apontados para o norte, o fortim oferecia esta frágil defesa do continente. Aqui no extremo da mansa e tediosa planície costeira gaúcha, um fortim em defesa da invasão castelhana que nunca aconteceu. Mais tarde, em 1822, o fortim já desaparecido, foi reerguido pelo Cel. Francisco de Paula Soares de Gusmão com o no me de “Baluarte Ipiranga”. Tão frágil como o primeiro.

Em 1839, de acordo com Ruschel, a vila das Torres tinha uma única via transitável assim descrita: “…um longo desfiladeiro entre um dos montes que dão nome àquele lugar e um grande paul (alagadiço), então invadeável.” Este caminho existia desde os tempos mais remotos, era a trilha utilizada pelos índios (cariós e arachãs) que aqui habitavam. Naquela época já era o único caminho pois pela beira-mar havia uma quantidade enorme de rochas que obstaculizavam a passagem pela beira mar, pela lagoa existiam os perigosos banhados e pelos morros existia o incômodo de subir e descer.

Além deste caminho, nessa época, já existiam a casa denominada de número um, pertencente ao Alferes Manoel Ferreira Porto, e a igreja Matriz de São Domingos das Torres. E conforme descreveu Ruschel as condições de sanidade da população torrense não eram muito boas. A maioria das famílias moravam na zona rural, em casas pobres no meio das suas roças e campos. O entorno do hoje centro histórico da cidade foi descrito como quase deserto, muita areia, mato e poucos moradores.

“O terreno é como o resto antecedente, de praias e falto de matos e pastos. Não tem moradores, só uma casa de registro, situada nas ditas Torres, que tem um Cabo de Esquadra com dois soldados da Cavalaria Ligeira. Antes de chegar ao campo das Torres passa-se por cima de um pequeno morro, a esquerda do caminho, está uma pequena casa que é da família do tal Cabo de Esquadra.” A descrição do que seria a Torres daquela época segue: “Pela esquerda, o terreno, muito pantanoso, tem bons matos e boas madeiras. Em cima do dito morro, na parte que faz frente ao norte, há uma bateria, sem artilharia, fabricada de terra, com quartéis nos quais estiveram cinco Companhias do Regimento de Santos, pelo tempo da Campanha. O resto do caminho é de praias, não tem pastos, nem matos que prestem, nem moradores.”

Nesta época, os moradores desta região eram poucos índios e mestiços que restaram dos prisioneiros de guerra trazidos para trabalhar nas obras da igreja, imigrantes açorianos que vieram de Desterros e Mostardas para a primeira colonização (1777) e os 422 imigrantes alemães que vieram em 1826. De acordo com o recenseamento da época (1826) o total de moradores do distrito era de 1120 pessoas, sendo 675 homens e 445 mulheres.

Esse era panorama da cidade de Torres e região a partir de 1800, quando iniciou-se a mais contundente colonização do centro urbano e rural.




Veja Também





Links Patrocinados