OPINIÃO – “SÓ PODIA SER TORRENSE”

Quem vive na cidade há alguns anos, sendo nativo ou não, já deve ter percebido que não somos (me incluo nessa) mais a maioria, e não estou falando só da época de veraneio.... Já não somos mais a maioria em todo o ano.

Movimento intenso no trânsito do centro de Torres a noite (FOTO - Coluna Roni Dalpiaz)
27 de janeiro de 2024

Uma pessoa (veranista, eu acho), mal educada e imprudente, em um carro de luxo cruza forçando a entrada na avenida na frente de um carro com placas de Torres – e se acha, ainda, no direito de xingar a ocupante deste carro com a seguinte pérola: “Só podia ser torrense e ainda com um carro velho”. Duas supostas ofensas vindas de uma pessoa que se sente tão confortável na cidade a ponto de xingar o próprio morador como se ele fosse o forasteiro.

É, parece que a  cidade não pertence mais aos torrenses.

Essa é uma afirmação forte, porém verdadeira. A movimentação (migração) das pessoas pós pandemia e a proliferação desenfreada de edifícios na cidade deixou esta afirmação cada dia mais verdadeira.

Quem vive na cidade há alguns anos, sendo nativo ou não, já deve ter percebido que não somos (me incluo nessa) mais a maioria, e não estou falando só da época de veraneio. Já não somos mais a maioria, em todo o ano.

A população flutuante e os veranistas que para cá vêm, estão vivendo mais tempo aqui do que na sua cidade de origem, e o resultado negativo disso é a supervalorização dos espaços centrais da cidade empurrando os nativos cada vez mais para fora do centro urbano. Onde havia uma casa (de torrense ou de veranista) já tem um ou mais edifícios com 30 ou mais apartamentos. Eu sei, isso acontece com todas as cidades e, atualmente, está acontecendo com Torres, porém com uma grande velocidade.

Mal comparando, a cidade de Veneza já não pertence mais aos venezianos há algum tempo. Eles tiveram que deixar a cidade por causa da invasão de turistas, a inflação dos imóveis e o aumento do custo de vida no local.

“Boa parte da população veneziana se mudou para fora do centro — que chegou a somar 150 mil habitantes nos anos 1950 e hoje tem um terço disso. Muitos preferiram colocar suas casas para alugar ou venderam a viver como estrangeiro em sua própria casa, em meio a hordas de turistas que, segundo a prefeitura, ainda são responsáveis por 80% dos casos de vandalismo, incluindo pichações em prédios históricos. Veneza tem mais leitos para turistas (entre hotéis e locações) do que seus 49 mil residentes no centro histórico. Os 52 mil visitantes diários passam de 100 mil na alta temporada.”

Não chegamos, ainda, a esse ponto, mas caminhamos a passos largos para isso. O espaço destinado às novas construções foi ampliado no novo Plano Diretor e isso, ao contrário do que pensam os legisladores, vai levar a cidade ao esgotamento/falência de serviços vitais como o fornecimento de água, luz e esgoto, saúde e segurança. Viraremos uma metrópole em número de edifícios sem termos a quantidade de serviços públicos de uma grande cidade.

E, assim como os venezianos, estamos nos sentindo estrangeiros na própria cidade, isso fica claro quando os “visitantes” te xingam de “torrense” como se ser torrense fosse uma vergonha ou um demérito.

Espero que essa pessoa mal educada que transita nervosa pelas ruas de Torres (turista, veranista ou seja lá o que for), lembre-se, na próxima vez que xingar um torrense, de ao menos usar os palavrões usuais para expressar sua raiva ao povo torrense, que, ao contrário dela, sempre acolheu bem seus visitantes, mas já não mais tolera ser percebido ou tratado como menor/inferior. Esse tempo, felizmente, já passou.

Ah, e a cidade continua sendo dos torrenses (embora em menor número) e, também, de todos aqueles que vêm para cá desfrutar as belezas da cidade e a cortesia e acolhimento dos torrenses.




Veja Também





Links Patrocinados